Nossos últimos feriados me levaram a pesquisá-los em outros
países, para saber como funcionam. Minha filha Marta reside em Londres, e foi
de grande ajuda: há alguns feriados e dias de festas que abrangem todo o Reino
Unido, o País de Gales e a Irlanda, separadamente ou em conjunto. Consultei uma
lista minuciosa da editora de música Boosey & Hawkes, pródiga em “holidays”,
“bank holidays”, “days off” e “bonfires”. “Holiday” não é sinônimo de ‘feriado’,
nem é das primeiras traduções nos dicionários, cujos verbetes se referem a festividades,
celebrações, e não necessariamente a um dia sem trabalho.
Londres: a caminho do trabalho |
No Reino Unido, entre os chamados “bank holidays”, temos o Ano Novo, a segunda-feira de Páscoa, o “Early May”, os “bank Holidays” da primavera e do verão, o Natal e o “Boxing Day” (a “caixinha de Natal”), no dia seguinte aos festejos. No “Bonfire” de 5 de novembro se comemora o armistício da Primeira Grande Guerra, mas sem folga no trabalho.
Her Majesty, Queen Elizabeth |
Celebra-se o Saint George’s Day, que é também o dia da patrona
da Inglaterra, Sua Majestade, Chefe de Estado e da Igreja Anglicana (e ninguém
folga para louvar: “Long live Her Majesty”!). Já em junho temos o “Trooping the
Colours”, aniversário da Rainha (dia normal de trabalho!), e o Dia Nacional da
Inglaterra, espécie de ponto facultativo (facultativo mesmo, não é sinônimo de feriado, como no Brasil!). O “Harvest
Festival” (Festival da Colheita) em setembro corresponde ao “Thanksgiving”
americano – nos EUA e Canadá a data é feriado, mas no Reino Unido não.
Seattle, WA |
Nos EUA, a décima emenda da Constituição dá poderes à
República de decretar feriados para a capital (D.C.) e seus departamentos
federais pelo país, sendo facultado aos estados legislar sobre o assunto independentemente
(até o próprio Natal é observado como feriado em apenas certo número de estados
em todo o país). A cidade de Seattle, onde mora meu filho Lucas, tem 10 “holidays”,
mas o site do governo informa que é preciso consultar “em quais deles o
trabalhador tem direito a descanso remunerado”. As férias por lá são de 12 dias
por ano, e de 30 dias após 29 anos de serviço. No serviço de meu filho (empresa
privada), após o 1º ano, 40 horas de trabalho de férias (uma semana), após 2
anos, duas semanas, após 5 anos, 3 semanas. Mas se você muda de emprego... ai, você
perde tudo. (Ah, e tem quatro feriados ao ano para descanso, felizes eles!).
No Brasil, não se trabalha um número bastante expressivo de
dias, decretados por lei. Só os feriados nacionais já somam oito, efetivamente,
a serem observados em todo o país, entre religiosos e pátrios, como os de N. Sª
da Aparecida e da Proclamação da República. Os feriados móveis, mesmo que
pagãos, dependem da tradição católica, como o Carnaval (do latim
“carne-levare”, ‘suspensão da carne’). Há a Sexta-feira Santa e o Corpus
Christi, já perfazendo um total de onze dias sem trabalho. Aos
municípios é facultado, ainda, decretar até 4 feriados – dentre eles, claro, o
da padroeira (ou padroeiro) local, assim como as datas de início e término da
fundação de cada cidade (Lei 9.335/1996). E mais: no estado de São Paulo,
acrescente-se o dia 9 de julho, da revolução de 32, enquanto no Rio de Janeiro
há os dias de São Jorge (23 de abril) e da Consciência Negra (20 novembro).
Fora isso, no Rio a 3ª segunda-feira de outubro é Dia do Comércio e dos
trabalhadores da construção civil, e estão liberados do trabalho comerciários e
operários de obras. Este ano, a Prefeitura de São Paulo pretende 'dar' feriados nos dias de jogos do Brasil, e isso somado aos 'enforcamentos' oficiais e por opção...
Frutas e mel: Hosh Hashana |
Antes de fechar o quadro nacional,
há mais feriados, de difícil compreensão que não seja unicamente pela ótica da cabala
populista de votos: a Assembleia Legislativa do Rio aprovou (Lei 2.435/2013)
feriados exclusivos para os judeus: ‘Hosh Hashaná’ (Ano Novo), o ‘Yon Kippur’
(Dia do Perdão) e o ‘Pessach’ (Páscoa), este último celebrando o êxodo dos
hebreus do Egito. Foi além o ex-prefeito Gilberto Kassab, de São Paulo, que acrescentou
aos feriados judaicos os islâmicos, como o Ramadã, a ser celebrado em duas
datas móveis em agosto. (E os servidores da cidade, além de tudo isso, ainda podem
gozar dez abonos de faltas anuais e 3 meses de "licença-prêmio" remunerada a cada 5 anos).
Getúlio e a CLT |
Getúlio
Vargas deu ‘de presente’ ao povo brasileiro a Consolidação das Leis do Trabalho
(CLT), inspirada na “Carta del Lavoro” fascista de Mussolini (acima). A CLT assegurou
garantias e benefícios a todos os trabalhadores e lançou o “abono de Natal” (depois,
“décimo terceiro salário”).
Promulgação da nova Constituição Federal: 1988 |
A Constituição de 1988 consolidou um mundo de
direitos, completando a coleção. Muito bom. Por outro lado, perpetrou o absurdo
dos absurdos, o Art. 19 do Título X, que estabilizou no emprego, pelo resto de
suas vidas e herdeiros, milhões de servidores, em boa parte detentores de
funções sem cargos para as quais foram admitidos sem concurso por algum mérito ou
por motivos tão singelos quanto a indicação de um padrinho político.
Agora, chegam esses feriados e quem emprega funcionários,
mesmo no pequeno comércio, ou chama seus familiares para ajudar (um dia sem
receber lhes faz falta em seu sustento!). Há os que simplesmente já trabalham o
ano inteiro com familiares, economizando encargos, horas extras,
FGTS, férias e outras despesas.
Quando não é assim, simplesmente fecham a
contragosto nos feriados, para prejuízo deles próprios e da comunidade que utiliza
seus serviços. No Brasil, sem querer entrar no mérito das comparações deste texto,
vê-se acontecer lá no andar de cima uma imensa bacanal financeira. Com tudo isso, deve
ser mesmo – diria um estrangeiro que não conhece nossa terra - um país modelo, extraordinariamente
próspero e rico.