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sexta-feira, 24 de abril de 2015

OS HOBBIES DOS MÚSICOS E A MÚSICA COMO HOBBY

Antonin Artaud, teatrólogo,
ator e gênio louco
Por estar imerso dias inteiros no pensamento musical, no trabalho artesanal diário intensivo, no almoçar, jantar e dormir música, o artista se deixa envolver tanto que às vezes perde o tino da realidade, de seu lugar no mundo e até do tempo. Claro é que, quase intoxicada pela música, como aliás acontece em muitas outras artes, a introspecção vira neurose com extrema facilidade, já que é tênue a linha divisória entre uma e outra.

Quixote por Jules David (1828)
Lembro-me de uma gravura do escritório de meu pai que retratava Cervantes, sobre quem sobrevoavam as fantasias do escritor castelhano, seu Quixote, Sancho e outros de seus personagens, a atormentá-lo entre livros e papeis. Embaixo, a frase reveladora: “embebeu-se tanto na leitura que passava as noites em claro”. E lá estava Cervantes, largado sobre uma poltrona, embriagado por volumes, tomos, fantasias e fantasmas.

Clarice Lispector, em autorretrato
Para encurtar o título deste artigo, usei hobby, mas poderia incluir ‘outra ocupação’ ou ‘outra profissão’, 'artistas', 'pintores'. Assim, prossigo agora um pouco mais amplamente. Clarice Lispector, das letras como Cervantes, pintava para fazer transbordar um pouco a inteligência e cultura enormes que sobrecarregavam sua mente. Outro escritor, também amigo de meu pai como Clarice, Lúcio Cardoso, autor da “Crônica da casa assassinada” (1958), subjetivista como Clarice, foi vítima de um AVC e como ela gostava de pintar.
Lucio Cardoso


Obra de Lucio Cardoso
Lembro-me de ter ido com meu pai um dia visitá-lo, e, ainda garoto, fiquei estarrecido ao vê-lo criar uma tela com um pincel entre os dedos dos pés, molhando-o nas tintas da palheta e criando, pela dificuldade de controle do pincel, cenas com jeito de Van Gogh. Ele apenas precisou trocar o meio de expressar em arte sua visão do mundo. O irlandês George Bernard Shaw (1856-1950), mestre do teatro, também dividia seu tempo como ensaísta e crítico musical, área em que era um analista de mão cheia.

Schumann (bachcantatas.com)
Grandes compositores como Robert Schumann (1810-1856), Hector Berlioz (1803-1869) e Richard Wagner (1813-1883), dividiam o dom da arte da escrita. Schumann, autor de quatro importantes sinfonias e um vasto repertório de canções (os Lieder) e para piano, também escrevia. Diagnosticado psicótico, assumia seu comportamento bipolar e claramente esquizoide: ora escrevia como Florestan, seu lado apaixonado e volúvel, ora como Eusebius, o sonhador austero, voltado para si mesmo.

Richard Wagner
Berlioz, aos 12, aprendeu latim, a ponto de fazer uma tradução precoce de Virgílio, com revisão de seu pai. E Wagner, autor da monumental ópera Tristão e Isolda, apaixonado pela literatura de Goethe e admirado por Nietzsche, escrevia textos com a mesma intricada técnica de suas composições, deixando uma obra polêmica, "O Judaísmo na Música", entre numerosos artigos e livros.

Messiaen: compositor e ornitólogo
Olivier Messiaen (1908-1992), importante compositor francês do século 20, é autor, entre outros, do fabuloso Quarteto para o Fim do Tempo. Foi capturado pelas tropas nazistas em 1940 e levado ao campo de concentração Stalag VIII, na Polônia. Com a complacência de um oficial amante da música, compôs uma peça para os três instrumentistas aprisionados, acrescentando depois um piano. Mas havia um outro lado, o bucólico, o lírico do compositor: o do ornitólogo estudiosíssimo, e seus pássaros devem ter-lhe feito muita falta nas agruras de Stalag.

Marcos Szpilmann à frente da Rio Jazz
Marcos Szpilman (falecido em 2011), médico, também tinha paixão pela música, despertada desde criança no violino, e fundou a lendária Rio Jazz Orchestra, que liderava com seu saxofone. E há os que nunca ou quase nunca exerceram suas profissões de advogado: o querido amigo compositor Osvaldo Lacerda, o tenor Jarbas Braga, o celebrado professor Dante Cavalheiro e até Noel Rosa, formado médico. Graduaram-se por imposição paterna, costume da época, ou simplesmente caíram de amores pela música largando a carreira.

"Ops, onde estão as chaves?"
O saxofone também é um instrumento muito querido por outros profissionais, a exemplo do Szpilman. Tive um cardiologista em São Paulo que deixava seu instrumento no consultório. Esperava fechar a clínica na Vila Clementino, em São Paulo, para tocar – a esposa dele não era muito chegada ao som que ele extraía. Certo dia, uma emissora de TV quis fazer uma matéria sobre músicos amadores, e eu pensei nele. Gravou com algumas guinchadas e harmônicos fora de hora, mas no caso isso não era relevante para a matéria, e sim o papel da música na vida de um médico.

Albert Einstein
Grande exemplo foi o físico Albert Einstein (1879-1955), um dos maiores de todos os tempos. “O que posso dizer sobre a obra de Bach? Nada. Ouvir, tocar, amá-la. E ficar calado”, disse ele. Aficionado do compositor alemão, tinha predileção pela sua obra para violino. E tocava Bach e Mozart com uma técnica básica para um amador, mas conseguia exprimir seus sentimentos com paixão. Nos momentos de exaustão de seus cálculos, teorias e investigações científicas, buscava na música um apoio especial – quem sabe daí não surgiram nesses momentos suas elucubrações sobre a relatividade e as equações de campo? (Veja e ouça abaixo gravação supostamente única de Einstein tocando a sonata em Si bemol KV 378 de Mozart)


Iberê Camargo (1914-1994)
(regiaoceleiro.com.br)
Entregar-se de corpo e alma à música (ou a qualquer arte) é muito bom, mas também é uma opção saudável fazer outra atividade, como culinária, jardinagem, ou escrever. Ter um ponto de diversificação, um derivativo, que talvez dê ao artista a alternativa de imersão aqui e ali, e não de total submersão. E aos que trabalham com outra profissão, a música pode ser um valiosíssimo passo nesse caminho da vida. Portanto, se ainda lhe resta a velha ideia de que música não é exatamente uma profissão – a realidade hoje mudou! -, ao menos ajude seus filhos a serem mais sensíveis, abrindo-lhes a inteligência para o caminho que porventura escolherem, músicos ou não. 

Shakespeare disse que o homem que não gosta de música não merece confiança nem crédito. Quem sabe se com ela mais presente o Brasil estaria padecendo menos dessa avalanche de absurdos nesse momento?

Tudo o que temos de bom veio dos neuróticos. Foram eles, e não os outros, que fundaram as religiões e compuseram as obras-primas. Jamais o mundo saberá o quanto lhes deve e, principalmente, o quanto sofreram para lhe dar tudo o que deram. (Marcel Proust)

sexta-feira, 17 de abril de 2015

HAMSTERS, GERIBÁS, RATOS E AFINS

Gerbo da Mongólia (arcadenoe.pt)
Quem nunca viu um geribá? E um porquinho da Índia? O geribá, gerbo ou esquilo da mongólia (Meriones unguiculatus) é um amável e carente bichinho. Rói tudo, por isso deve-se cria-lo em cercado de vidro, porque não dispensa nem madeira. Precisa de areia e serragem para escavar, dada sua origem passada nos desertos mongóis e siberianos, que o obrigava a buscar sementes e grãos, seu principal alimento. É brincalhão e inofensivo, agrada criancinhas e adultos que gostam de animais. Talvez seja um dos roedores de estimação mais simpáticos da grande família.

Um hamster guloso
(dicasemaisparaajudarumhamster.blogspot.com)
Hamsters todos conhecem. A palavra vem do alemão Hamstern, que quer dizer guardar, armazenar: suas grandes bochechas acumulam comida para ser deglutida aos poucos, herança de seus antepassados das terras áridas africanas e asiáticas. Também se chama criceto (do latim cricetinae), mas hamster com certeza dá um certo charme a esse roedor menos simpático do que o gerbo, apesar de ser também ótimo mascote. É usado em pesquisas em laboratórios, assim como camundongos e outros pequenos roedores. Um tipo de hamster tem pelos grandes que se desprendem com facilidade, razão pela qual deve ser evitado por crianças alérgicas. O outro, de pelos curtos, chamado ‘sírio’, é colorido e bastante brincalhão.

Hospital Felício Rocho, em BH
Quando criança, tive que fazer um exame de sangue, cruel tortura, e meu tio Marcelo, que era diretor do Hospital Felício Rocho de Belo Horizonte, levou-me para a coleta. Passando por uma sala, vi algumas gaiolas com lindos camundongos, branquinhos como coelhinhos da páscoa. Como chantagem, insisti até que meu tio prometeu me dar um de presente, na saída. Assim, meu sofrimento na coleta foi bem mais suave, ansioso pela recompensa.

Na saída, caixa com furos debaixo do braço, levei o bichinho comigo. Chegando ao Rio, coloquei-o em um caixote de madeira coberto com tela de arame, para que pudesse vê-lo bem. Mas o bichinho roía madeira que era uma beleza, e volta e meia conseguia escapar e fazer das suas travessuras, como apavorar a Mira, empregada, que chegou a subir gritando em uma cadeira. Roeu parte de uma das colunas de madeira que sustentava a cobertura da varanda, era um pestinha incorrigível.

Ratazana
Um dia, sumiu, e reza a lenda que a Mira o havia dado de presente para um lixeiro. Deve ter sido mais feliz com o gari, que estaria acostumado com as enormes e horríveis ratazanas que povoam esgotos e lixos, algumas de mais de um metro de comprimento – deve ter sido um mimo para ele.

Um grafitti de "welcome to NY"
Em Boston, quando me mudei para um apartamento no centro, logo percebi certos ruídos noturnos que, para meu horror, descobri virem de ratos – eu não sabia ainda que em Boston e NY há entre 6 ou 7 deles por pessoa, gestados em confortáveis ninhos feitos na lã isolante entre as paredes internas. Fui ao senhorio reclamar. Com muita educação, sussurrei para Mrs. Pinkhas que em casa havia ratos, e ela arregalou os olhos horrorizada e gritou Rats? Eu confirmei, e ela disse oh, Mr. Dourado, de que tamanho são esses ratos? Discretamente, mostrei com os dedos alguma coisa como 6 ou 8 centímetros, o que foi suficiente para ela soltar uma gargalhada e dizer ho, ho, Mr. Dourado, esses não são ratos, são camundongos, se o senhor se incomoda arrume um gato! (Claro que incomodavam, roíam até a borracha da porta da geladeira e, espremendo-se, lá dentro faziam a festa! O pão de forma eu deixava pendurado no cordão de acender a luz).

Com gato em casa, eu via dois, três camundongos por dia – squeek, squeek, e lá se ia mais um, na boca do bichano, devidamente ‘despejado’ do apartamento. Camundongos em desenhos podem ser simpáticos como o Mickey Mouse, mas são nocivos roedores quando não são mascotes como o meu cheiroso bichinho, nascido em laboratório.


Uma taxonomia. (melhorbiologia.blogspot.com)
João Sayad, economista pela Usp e doutor pela Yale University, mente brilhantíssima que trabalhou com Franco Montoro, Marta Suplicy e José Serra, foi secretário de cultura do estado de São Paulo. Em 2013, publicou na Folha o artigo ‘A Taxonomia dos Ratos’. (Taxonomia, segundo o velho Houaiss, é “ciência que lida com a descrição, identificação e classificação dos organismos”).

O belo Forum do TRT da Barra Funda de SP (foto de autoria desconhecida)
Em seu saboroso texto, Sayad convida o leitor à taxonomia da corrupção, do simples fiscal ao parlamentar. Lembrou que a taxonomia passa também pelo setor privado, fazendo par ao poder público. Para Sayad, a corrupção que ele classifica como a la grande é a dos pesados investimentos públicos, negociatas, toneladas de cimento, como o prédio do TRT na Barra Funda, SP, que custou 160 milhões (em dinheiro da época) acima do previsto. Deu no que deu.

(revistaepoca.globo.com)
Sayad aborda também a chamada ‘corrupção pequena’, que contrata parentes, cria notas e empresas de fachada, adquire material superfaturado, modalidade que segundo ele poderia ser classificada com o nome elegante de petit cash. E calcula que esse tipo de pequeno desvio, a longo prazo, leva a sangrias milionárias nos cofres públicos, são milhões de custo com benefício zero, vão direto para os ratos e suas ninhadas. E diz que nesse tipo de falcatrua, que classifica como ‘corrupção brega’, “o parasita permanece grudado na instituição hospedeira que suga por longos períodos”. E termina o texto inconcluso, declarando-se indignado ao final, assinando por derradeiro sua ‘obra aberta’, um convite à reflexão sobre essa cultura brasileira de alta toxicidade.

Château des Baux, Provence, França: o reino roído
(eduluzwordpress.com)
Paro aqui na alegoria do Sayad, poetando que ratos rotos e ratazanas reais roeram as roupas do reino. Portanto, não merecem ser colocados na companhia deles esses afáveis, simpáticos e confiáveis gerbos, hamsters, porquinhos da Índia e camundonguinhos domésticos.

(ig.com.br)

sexta-feira, 10 de abril de 2015

DENGUE: PREVENÇÃO, CUIDADOS E OS REPELENTES ULTRASSÔNICOS

Vacina contra a dengue em teste pelo Instituto Butantã
Novas esperanças para a diminuição da praga da dengue se voltam, agora, para cinco laboratórios, sendo os mais adiantados na corrida a multinacional francesa Sanofi, que trabalha com o vírus tratado da febre amarela com extratos de cepas da dengue, e a GSK britânica com o Instituto Osvaldo Cruz (RJ), que pretende iniciar os testes em humanos até o fim deste ano. Há ainda pesquisas avançadas no Instituto Butantã (SP), mas que jogam para 2018 a expectativa de uma vacinação em massa.

Campanha de vacinação contra o H1N1
Os laboratórios mais adiantados trabalham para que a vacina comece a ser usada ainda neste verão, época em que aumenta a incidência de casos. Mesmo assim, a eficácia prevista é de 61%, não erradica a doença e menos ainda o Aedes Aegypti, mosquito que serve de hospedeiro à dengue (dados: Folha de São Paulo, 6 de abril, D5). Regiões mais pobres e com populações menos esclarecidas, ou ainda despreparadas para esses programas de vacinação serão as mais penalizadas. A vacina protegerá com algum resultado compensador os humanos inoculados, mas não acabará com o Aedes ou mal maior, a dengue.

Como não há qualquer perspectiva de erradicação do vírus, por enquanto, juntamente com os esforços empreendidos nas pesquisas para uma vacina que imunize em massa há que se prevenir, adotando conjuntos de medidas preventivas em estados e municípios: evitar acúmulo de água parada, pneus e quaisquer objetos expostos que possam servir de criadouros de larvas, deixar piscinas e tanquinhos clorados e limpos.

Quanto ao uso de produtos químicos no corpo, há riscos e deve ser objeto de cuidado: o uso de repelentes químicos diariamente em crianças, conforme vemos em matérias na imprensa e postagens nas redes sociais. Há produtos repelentes naturais inofensivos para a pele, como o caseiro 'repelente de pescador', feito com uma mistura de 100ml de óleo para bebê, 0,5L de álcool e 1 envelope (10g) de cravo da Índia. Também estão na lista nociva as velhas espirais fumegantes (foto acima) e similares improvisados, obviamente ameaças à saúde. 

Plantação de crotalárias
Ajudam ainda telas nas janelas, ventilador ligado (quando a temperatura permite) e outras prevenções muito mais saudáveis do que qualquer opção química. Do lado alternativo, há experiências orgânicas já bem sucedidas e baratas, ainda em início de uso, como a crotalária (do lat.: crotalaria pumila), arbusto que pode chegar a mais de 2,5 m de altura e tem a capacidade de atrair predadores do Aedes, como certa espécie de libélula que se aproxima do mosquito infectado, por sua vez atraído pela planta. Essa, se perto de água, também aproxima a libélula das larvas do mosquito ali depositadas.


Sementes de crotalaria juncea distribuídas pela administração
para os moradores do Residencial Villa Monte Verde (Tatuí)
Se não há estudos científicos que determinem com maior precisão a eficácia (e em qual proporção acontece) a ação da crotalária, ao menos se tem certeza de que ela pode ser um coadjuvante a mais no controle do vírus. Algumas espécies de crotalária são conhecidas no nordeste do Brasil como chocalho ou xique-xique, uma vez que suas sementes são bastante úteis na confecção de caxixis e outros instrumentos rudimentares de percussão. Também há espécies tóxicas da planta, como a mucronata, que pode ser nociva para o gado bovino e, claro, seres humanos, razão pela qual a aquisição de sementes deve ser cuidadosa. A crotalaria madurensis, de origem indiana, é um conhecido fungicida e antibacteriano, cujo efeito é semelhante ao da crotalária juncea, abundante no Brasil. 

Repelente ultrassônico de parede 
Pelo lado mais saudável do combate à dengue e outros insetos e ratos, chegam ao país os repelentes eletrônicos. O tipo eletromagnético (EM) é condenado por causa da emissão de micro-ondas nocivas, como as que emitem celulares e redes elétricas de altíssima tensão. O tipo ultrassônico é o mais popular, barato e eficiente, e a explicação é simples: o ser humano pode ouvir de 20 a até 20 mil Hz (Hertz, medida de frequência).

Medidor de frequência hertziana
Músicos sabem disso! A última nota do piano, a mais aguda, um Dó chamado C8, vibra em meros 4.186 Hz, muito longe ainda do limite de 20 mil Hz (ver gráfico de um teclado abaixo). Nem pássaros nem animais domésticos – e, claro, bebês especialmente - podem ouvir emissões de ultrassom que atingem gafanhotos, entre 50 a 100 mil Hz, ainda bem longe dos 150 mil Hz emitidos por morcegos e sentidos por mariposas e traças.


Tabela de limites de percepção de pessoas e animais
(com especial atenção para os morcegos (bats
Nessa faixa acima de 20 mil Hz, chamada ultrassom, trabalham esses pequeninos aparelhos repelentes e inibidores de acasalamento de insetos como o Aedes Aegypti. Há algumas controvérsias sobre os efeitos em diversos estudos feitos nos EUA, mas o uso doméstico quase sempre confirma os resultados. 


Um desses pequenos aparelhos custa pouco mais de R$ 20,00, se comprado em grandes lojas, ou pela Internet, em sites confiáveis. Não usam refil ou produto químico algum, são absolutamente inaudíveis e inofensivos e têm um consumo ínfimo, algo como 0,0005 W, ao custo mensal, se ligado 24h/dia, de R$ 0,18 – para se ter uma ideia, seriam necessários 200 desses repelentes ligados ao mesmo tempo para chegar ao consumo de uma lâmpada de 100 W. O modelo ultrassônico foi criado em 1962 nos EUA, e teve a primeira patente registrada em Minnesota em 1963. Para os que quiserem procurar e eventualmente comprar um desses aparelhos, vale buscar sites confiáveis e prestar atenção na avaliação dos usuários para cada modelo anunciado.

O Inferno (Dante).
Ilustração de Stradanus (1523-1605) para o Canto 8
Já venho usando três desses repelentes, que devem se popularizar no país juntamente com outros métodos preventivos e profiláticos contra a dengue. Há quase duas semanas não ouço um zum-zum incômodo sequer, e por isso durmo tranquilo, até porque o fantasma da doença pode parecer a porta do inferno, mas o diabo que o anuncia atende pelo nome de zumbido.



sexta-feira, 3 de abril de 2015

JANINE, UM FILÓSOFO NO MINISTÉRIO. UM ESTRANHO NO NINHO?

Renato Janine (foto: filosofia.fflech.usp.br)
Fomos surpreendidos com a notícia da indicação do filósofo Renato Janine Ribeiro, titular em Ética e Filosofia Política da FFLCH da USP, para a pasta da Educação. Doutor, tem o brilho de um mestrado na prestigiosa Sorbonne (Paris I), e, como administrador, a direção de avaliação da Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior), fundação ligada ao MEC e órgão de suma importância para a pós-graduação e pesquisa no Brasil. Foi membro da diretoria da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência.

Nota: este artigo não contém expressão de preferências político-partidárias, apenas reflete sobre a gestão de ministros e secretários filósofos (ou não) à frente de pastas de governo em diversas situações e períodos da história. 

Thomas Hobbes
Excetuando-se a parte final deste brevíssimo currículo, o araraquarense de 65 anos não tem experiência como administrador no minado campo político, mas ao revés pesa a seu favor o fato de não ser militante partidário e ter perfil técnico. Sofreu grande influência das ideias de Hobbes (1588-1679), e por meio dele Descartes, Maquiavel e Aristóteles. À primeira vista, seria um perfil mais afeito à área da cultura, mas não se pode tirar-lhe a chance de algum sucesso no MEC por mera antecipação.

Marilena Chaui (foto: ufmg.br)
A também filósofa uspiana Marilena Chaui foi Secretária Municipal de Cultura de São Paulo (1988-1992). Trabalhei na gestão dela – e afastando desde já surradas discussões sobre sua pessoa ou polêmicas políticas -, e mostrou-se uma mestra nos embates, sempre apimentando disputas. Nos anos em que estive com ela na Secretaria, disse-me, uma vez, após acalorada discussão: “dos conflitos emergem as soluções”. Guardo até hoje a frase, talvez saída da principal especialidade da filósofa, Baruch Espinoza (Países Baixos, 1632-1677), assunto de seu livro ‘Espinoza: Uma Filosofia da Liberdade’. Mesmo sob críticas constantes, podemos creditar a ela, ou à interferência dela, a lei 11,231/92, que criou o quadro de cargos e salários do Municipal e Escolas de Arte, que apesar de ter sido dispensada pelos demais prefeitos foi plenamente empregada nas gratificações por apresentação e outros; o reajuste de 203% para o Quadro de Atividades Artísticas entre outubro e novembro de 2009, que estava absurdamente defasado; a criação dos ônibus-bibliotecas, a reforma da biblioteca Mário de Andrade, a lei da Orquestra Experimental de Repertório, o Sambódromo e a Lei de Incentivo Municipal, apresentada por um vereador. Gestões à frente da Secretaria Municipal de Cultura.

Modelo de memorando da SME
Marilena confessou-me que demorou três meses para entender a diferença entre um memorando, um expediente e um ofício, confidência que fez com naturalidade. Sabendo de suas limitações, chamou para auxiliá-la no gabinete uma pessoa com larga experiência em administração, dando-lhe o poder de executar as ideias que lhe povoavam a mente. Com certa ironia, disse que se chegasse ao limite usaria os seus “poderes imperiais”, mas gostava sempre de ouvir a todos.


CCSP (detalhe)
Para dirigir o importante Centro Cultural São Paulo, um amplo espaço multidisciplinar de arte, teatros, acervo fonográfico e biblioteca, Marilena chamou outro filósofo uspiano, José Américo Pessanha, que logo seduziu com sua simpatia os funcionários do Centro pelo seu jeito particular de liderar e conversar. Para ajudá-lo, convidou para a Diretoria Administrativa Maraíza Nascimento, de longa bagagem em gestão pública, rápida e eficiente na engrenagem da prefeitura, conhecedora da máquina, seus meandros e vícios. Era um dos chamados “tratores” da Prefeitura paulistana. (Tive a felicidade de tê-la como Assistente durante alguns anos na Escola Municipal de Música).

Janine assume no dia 6 de abril, e vai começar batendo de frente com o enorme paquiderme, doente quase terminal que é o MEC. Terá desafios monumentais para enfrentar, como o sucateamento do Fies e do Pronatec, que já demitem “de baciada”, salários de professores achatados, cofres quase vazios e a estrutura surreal. Quer flexibilizar currículos e fazer interagir cultura e educação, entrosando-as - o que por si é bom, já que cultura é o “cabedal de conhecimentos, a ilustração, o saber de uma pessoa ou grupo social”, o que dá vazão ao meu entender de que cultura é o enorme e fértil campo sobre o qual a educação deve ser plantada. (A citação grifada é do velho Houaiss, uma definição simples e correta).

Joaquim Levy (foto: Diário do Nordeste)
Seu futuro colega da Fazenda Joaquim Levy é homem do ramo, mas estranho no ninho político-partidário. Vai fazer à sua maneira e de uma vez muito do que deixou de ser feito há anos, com duro e arriscado ajuste econômico, e para isso mostra independência e força para impor suas ideias, longe do jogo - gostem ou não - da direita ou da esquerda (que, diria hoje Cecília Meireles, “ninguém mais sabe o que seja”). Mas ninguém tem bola de cristal para garanti-lo apresentando rumo mais alentador para o momento trágico em que vive a economia nacional. Verdade é que, ironicamente, volta e meia esse ‘estranho no ninho’ tem se mostrado mais sagaz e habilidoso no trato com o Legislativo do que muitos políticos com bandeira partidária.

Gustavo Capanema
Um dos mais elogiados ministros da Educação do passado foi Gustavo Capanema (gestão 1934-1945). Formado em direito e político de carreira, apesar de ligado ao estadonovismo não hesitou em chamar Lucio Costa e Niemeyer (declarados comunistas desde sempre) para a construção do então novo prédio do MEC (1943), com consultoria do francês Le Corbisier, dotando-o de obras de grandes artistas como Portinari e o paisagismo de Burle Marx. Em plena ditadura, Capanema reorganizou o Ministério da Educação e da Saúde Pública em 1937, e criou o Instituto Nacional do Livro e o Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, entre diversos outros.

Palácio Capanema (antigo prédio do MEC, no Rio)
Evitando o mérito de indicações políticas, lembro que foram ministros, começando pelo antecessor de Janine, Cid Gomes, engenheiro e peixe absolutamente fora d’água, Henrique Paim e Mercadante, economistas (o último com experiência de apenas um ano como gestor na Ciência e Tecnologia), Haddad e Tarso Genro, advogados, Cristovam Buarque, engenheiro mecânico, economista e ex-reitor da UnB, só para falar na gestão Lula-Dilma.

Aristóteles
Se Janine conseguir manobrar as crises do Pronatec e do Fies, as inevitáveis greves, a falta de recursos, e implantar um pouco de seu sonho modificador no MEC, pode ser uma gestão saudável, mas não terá chão para ir além disso. Vai precisar do amplo conhecimento de um Aristóteles, 


René Descartes
do racionalismo de um Descartes como gestor e de muito Maquiavel dos seus estudos no trato com os políticos. Justo é ter alguma esperança no Janine e dar-lhe um voto de confiança. 


Pior do que estava não fica.
Niccolò Machiavelli