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quarta-feira, 14 de setembro de 2016

PARAOLIMPÍADAS: QUANDO TODOS SÃO CAMPEÕES

Tiraram o “o” de paraolimpíadas não por acaso, foi por imposição do IPC (International Paralympic Committee). Muitos contestam a grafia errada da palavra. Pasquale Cipro Neto, especialista veterano na análise de assuntos idiomáticos, diz que, uma vez que em inglês se escreve Olympic Games, a distorção se deve a puro marketing, para diferenciar esses jogos dos deficientes dos outros, tradicionais, as Olimpíadas. Segundo o Houaiss, “Paraolimpíadas”, leva o prefixo “para”, do grego, sugerindo “semelhança”, ou “ao lado de”. Mas diversos órgãos de imprensa insistem na grafia “paraolímpicos”. (Voltaremos a esse tema no final, por relevante).  

O Discóbolo. Grécia, @ 445 a.C.
Os Jogos Olímpicos são uma grande festividade, à tradição surgida na Grécia antiga. Já as paraolimpíadas congregam atletas portadores de deficiência visual ou mental, distrofia muscular, paraplegia, quadriplegia, espinha bífida ou deficiências, entre outras. A ideia surgiu entre veteranos ingleses da II Guerra, em 1948, que organizaram um pequeno evento para seus esportes. Em 1976, os Jogos de Verão incluíram atletas deficientes de 40 países. Mais tarde, as Paraolimpíadas passaram a acontecer imediatamente após o encerramento dos Jogos Olímpicos, à sua imagem e semelhança. Como perto de 80% dos participantes foram vítimas de acidentes, o esforço para se concentrarem em um esporte tornou-se uma arma poderosa contra a depressão que persegue as vítimas de acidentes ou de problemas congênitos. As Paraolimpíadas simbolizam para eles uma janela para a vida.
Pessoalmente, gosto do aspecto plástico das competições, sem dar lá muita importância para medalhas, milímetros, décimos de segundos e afins. Aprecio  a beleza plástica dos esportes. Atraem-me várias modalidades, especialmente a ginástica olímpica, o salto com vara, o nado sincronizado e todos os que me causam a impressão de estar assistindo a uma festa artística entre nações.
Neymar: um chute com fé
Como bom brasileiro, tenho orgulho dos nossos medalhistas, e confesso que torci pelo Neymar naquele gol, o último chute, último pênalti. Tanto pelo tento perfeito quanto pela emoção do jogador, que sabia que, errando, seria sacrificado no Coliseu imaginário por público e crítica, como já vinham lentamente punindo o garoto santista de há algum tempo, por não manter a performance espetacular de sempre. Uma exigência cruel a que se sujeitam os grandes atletas tornados ícones e frequentemente destruídos pelos que antes os idolatravam. Aplaudi o gol, mas vibrei mais pelo Neymar, que com uma só bala na agulha não poderia errar. Salvou-se da turba linchadora de sempre.
Sinto-me pequeno diante desses heróis, esses jovens que fazem, a despeito de deficiências, o que a imensa maioria de nós, livres delas, sequer cogitariam fazer. Ao chegarem nas piscinas, pistas e arenas, já são todos vencedores. Nas Paraolimpíadas, vejo a ideia de competir, mais do que nas Olimpíadas, como sendo ainda menos relevante. Claro que temos grandes nomes, como Ítalo Pereira, nado de costas, Daniel Dias, nos 20 m livres de natação, Ricardo Costa Oliveira, atletismo, o recordista da corrida de 400 m rasos Daniel Martins - entre ouros, pratas e bronzes, e podemos imaginar o que isso significa para eles. Se perderam algo na vida, por outro lado erguem-se no Olimpo. E se no peito lhes adorna uma medalha, é um mérito a mais, já que têm como grande vitória sua luta para serem atletas.
Não importam falhas e gafes na abertura, especialmente tratando-se de competição desse porte e tantas especialidades. Se aconteceram em maior grau do que na Inglaterra (2012), é natural para um país estreante como o nosso, sede pela primeira vez. O gosto de alguns shows na abertura pode ser discutível, outros por terem custado muito mais do que nossas combalidas finanças públicas deveriam custear. Mas tudo isso é secundário quando se trata de uma festa de titãs, sonhadores que não se entrevaram por causa de alguma deficiência nata ou adquirida. Pelo contrário, chamam mais atenção para a necessidade de termos gente como eles inserida em nossa sociedade, pois se são melhores no esporte do que poderia a grande maioria de nós, podem ser no mínimo iguais no estudo e no trabalho.
Termino com severas críticas. A obrigação do IPC de utilizarmos “paralímpicos” para diferencia-los dos Jogos Olímpicos não me agrada. Assim como acho um absurdo apagarem os tradicionais aros, representeando os cinco continentes, símbolo de união. Em algumas pistas, “manchas” dos aros ainda podiam ser vistas. Em seu lugar, foram adotados lenços coloridos estilizados. Um atleta inglês, que tinha os aros tatuados no peito, teve de cobri-lo com um adesivo da bandeira da Inglaterra, e isso é triste. Se minha opinião valesse alguma coisa, faria o contrário: ampliaria o número de modalidades dos Jogos Olímpicos para abraçar os gêneros hoje chamados paraolímpicos: a isso se chama inclusão! Todos igual, nada es mejor (Enrique Ricardo Discepolo, 1935, gravado por Carlos Gardel).

Para macular de vez a festa, expuseram-nos como povo extremamente mal educado e grosseiro. Falo das vaias, dos gritos, interrupções seja contra ou a favor de quem quer que seja, um triste retrato de nossa incivilidade exibida ao resto do planeta. Isso, quando as luzes deveriam estar apenas nos atletas, que, junto aos colegas brasileiros, devem ter-se sentido perplexos, já não bastasse a humilhação do péssimo exemplo de mau-caratismo basilar que temos exposto ao mundo, uma imensa e interminável festa de desvios, saques aos cofres públicos, corrupção generalizada e pilantragem.

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