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sexta-feira, 23 de abril de 2021

TERRAPLANISMO E AQUAPLANAGEM

 


O terraplanismo, ou ‘terra chata’ - que duplo sentido! – originou-se da crença de que o mundo era plano, em forma de disco ou quadrado. A concepção é bastante velha, desde a Grécia dos anos 300 a.C. e das eras do bronze e do ferro, e persistiu até o período helenístico (31 a.C.), e em países como a China, até o século 17! Na contramão, a ideia de uma Terra redonda era revolucionária, passou por Pitágoras (6 a.C.) e os pré-socráticos, que imaginavam um planeta esférico.


Todos os argumentos eram 100% empíricos, tanto do lado dos chatos da terra chata quanto dos que tinham suas ideias voltadas para a esférica, embora esses últimos buscassem alguma consistência e lógica em suposições e ilações para suas teorias. O primeiro grupo, da terra plana, baseava-se apenas em suas crenças, e empregava conceitos absolutamente pseudocientíficos. Não por coincidência, o terraplanismo, nos dias de hoje, é um modismo relacionado a teorias da conspiração e coisas do gênero. Entre os grupos que passaram a cultivar essas ideias pseudocientíficas está a International Flat Earth Research Society (IFERS), criada por Samuel Shenton em 1956 no Reino Unido, A partir de 1972, passou a ser dirigida pelo norte-americano Charles Johnson, que afirmou: “a ideia de uma Terra que gira é uma conspiração de erros que Moisés, Colombo e mesmo Roosevelt combateram” (revista Science Digest, 1980).


Antes disso, poetas como John Lennon, em “Because” (1960) confirmavam em trovas, poesias e letras sua contradita: “Porque o mundo é redondo / ele me liga...” (Parece que os poetas sempre souberam do formato real da Terra, talvez por sua visão de alcance infinito em divagações). Antes disso, em 1957, a bordo do Sputnik II, uma simpática cachorrinha russa, a terrier Laika, orbitara ao redor da Terra e deve ter constatado o formato esférico. Deveria, pois apesar de todas as precauções da época morreu durante a experiência.


Em 1961, o piloto soviético Yuri Gagarin lançou-se primeiro homem no espaço sideral e pôde ver a terra linda, azul e redonda, assim como depois seu rival norte-americano, Alan Shepard, Jr. Apesar dos inúmeros voos, fotos, filmes e relatos, os terraplanistas teciam liames com as teorias da conspiração mais absurdas – o mundo estava em uma guerra fria e em corrida espacial e valia de tudo, até negar com maldade as conquistas do inimigo. Se um lado enxergava dúvidas nas conquistas soviéticas, o outro questionava as filmagens da descida de Neil Armstrong na lua, em 1969.


No Brasil, a LHT Higs, conhecida como Brasil Paralelo, foi fundada em 2016 em Porto Alegre sob a orientação de Olavo de Carvalho, com os pupilos Ernesto Araújo e Jair Bolsonaro – este último atual presidente da República, entre outros. Olavo, “astrólogo” e sem qualquer formação acadêmica, reside em Richmond, EUA, e sobrevive à custa de doações on-line feitas por seus ‘discípulos’ a troco de tele-aulas que incluem   o movimento antivacina, teorias da terra plana e um ingênuo negacionismo da ciência e suas conquistas. Sempre adepto de teorias da conspiração, Olavo inocula em seus pupilos o veneno de uma pretendida nova extrema direita. Além do filho do presidente, encontra-se entre os seguidores de Carvalho o já citado ministro Ernesto Araújo, cuja péssima atuação sofreu duras críticas dos brasileiros bem informados e da diplomacia estrangeira. Era homem forte da chamada ala ideológica do Planalto, “inamovível” até sua exoneração, em março de 2021.


A esta altura, percebendo o  final deste artigo, o leitor deve estar se perguntando o porquê da aquaplanagem do título. Confesso que a palavra ultrapassou terraplanismo na mente sem pedir licença. Um sujeito versado nas coisas freudianas talvez aponte aí um lapsus linguæ, uma troça que o cérebro às vezes nos faz deixar escapar quando  falamos, um desvio involuntário do que deveria ter sido enunciado. Ou seja, escapou "sem querer querendo", diria aquele personagem cômico mexicano, e não deixa de fazer sentido. Aquaplanagem, segundo o Houaiss (acp 3): “Perda de controle ou equilíbrio de um veículo, causada pela falta de aderência dos pneus à pista molhada”.


Este lapso, ou ato falho, é expressão conhecida dos  psicanalistas e estudiosos que acontece no discurso (fala) ou pensamento segundo a ideia de que não  surgem por acaso, e sim por intervenção do inconsciente. Popularmente, então, o fenômeno da  aquaplanagem, que leva os motoristas despreparados ao volante a acidentes de grandes proporções, surgiu-me enquanto pensava na gravíssima situação por que passa o Brasil de hoje. 
Logo, não foi nem um pouco por acaso.

 

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