Juilliard School |
Há duas semanas, iniciei neste espaço uma pequena
“turnê” por conservatórios e escolas de música mundo afora, a propósito de uma
reflexão sobre o Conservatório de Tatuí, que em 2014 completa 60 anos. A
primeira visita foi à New England Conservatory, de Boston, onde estudei e
mantenho laços de amizade. Prosseguindo, hoje vamos à Ilha de Manhattan, onde
fica a prestigiosa Juilliard School. Inicialmente localizada em local privilegiado,
em plena agitação da 5ª Avenida, esquina da 12ª rua (sábios esses nova-iorquinos
que não precisam de GPS para achar um caminho, com suas numerações de ruas e
avenidas). Prédios importantes costumam levar os nomes de seus beneméritos
financiadores, como o Rockefeller Center e a própria Juilliard, cujo nome foi
cunhado em homenagem ao benemérito magnata da indústria têxtil Augustus
Juilliard.
Glorya Kauffman estúdio de dança |
A junção de duas unidades distintas da Juilliard
aconteceu em 1946 pelo proeminente compositor William Schumann, prêmio Pulitzer
de Música. Em 1951, Martha Hill agregou a Divisão de Dança, e em 1968 o novo
diretor, Peter Mennin, criou a Divisão de Artes Cênicas. No ano seguinte, a
escola foi levada para sua localização definitiva, no fabuloso Lincoln Center
for the Performing Arts (Artes Performáticas).
Kovner (2º a partir da esquerda) |
Agora, um lado pitoresco e inspirador: em 2006, o
bilionário, colecionador e mecenas Bruce Kovner doou à Juilliard sua coleção de
partituras originais, rascunhos e primeiras edições de Bach, Beethoven, Mozart,
Schubert, Chopin, Stravinsky e outros, incluindo os manuscritos do editor da
gloriosa Nona Sinfonia de Beethoven - com emendas, correções e rasuras do próprio
compositor na mesma partitura usada na estreia da obra em Viena, em 1824.
Joseph Polisi |
Mas não é só isso. Por iniciativa do próprio Kovner,
Presidente do Conselho da Juilliard, em ato anunciado pelo reitor Joseph Polisi,
foi criado em 2013 o “Kovner Fellowship Program”, para bolsas de estudos em
diversos níveis, cujo valor total - doado pelo conselheiro – foi de 60 milhões
de dólares! (Isso mesmo). Para participar do Conselho há disputa, e convém oferecer
uma quantia mínima, por volta de US$ 100 mil.
Yo Yo Ma, o "top" |
A Juilliard tem apenas 850 alunos em seus programas de
graduação e pós-graduação. Ingressar na escola não é nada fácil, o que faz dela
uma das mais seletivas: em 2007, apenas 7,58% dos candidatos foram aprovados;
em 2009, pouco mais, 8%, caindo para 5,5% em 2011 e retornando à média em 2012,
com 7,2%. A competição é celeiro para profissionais de ponta, e não faltam
brasileiros: o grande violinista Natan Schwartzman, o violoncelista Fábio
Presgrave, o trompetista Fernando Dissenha e os trompistas Ozéas Arantes (ambos
da OSESP) e Luís Garcia, as pianistas Sonia Rubinsky e Diana Kacso, além do
compositor Raimundo Penaforte, entre outros. Foi professor de regência e
titular da Sinfônica da Juilliard nosso maestro Eleazar de Carvalho. Artistas
internacionais de renome coroam o quadro de ex-alunos, tais como Emanuel Ax,
Leontyne Price, Yo-Yo-Ma, Itzhak Perlman, Henry Mancini, John Williams e James
Levine, entre outros.
Sala de cenografia |
Para manter essa estrutura ímpar de ensino de dança, artes
cênicas e música, a Juilliard conta com um staff impressionante: 24 diretores e
vice-diretores de diversas áreas, e cerca de 30 administradores. Os espaços são
amplos, adequando-se às diversas divisões, e os cuidados acústicos, tanto no
que diz respeito à reflexão sonora, quando for o caso, ou isolamento, na
maioria das vezes, foi cuidadosamente calculado. A sala de cenografia tem um pé
direito imenso, suficiente para sustentar maquinário e cenários, e ampla ainda para
acomodar diversos materiais, ferramentas e máquinas de todos os tipos. Além dos
cursos regulares de música, como os fundamentais harmonia, teoria e percepção,
história da música e performance, o aluno pode escolher “Liberdade e
Autodeterminação” ou “Perspectivas sobre Gênero e Sexualidade”. Fora isso, há bibliotecas
fenomenais à disposição no prédio da escola ou no New York Public Library for
the Performing Arts.
The NY Public Library for the Performing Arts |
Alice Tully Hall |
O Alice Tully Hall, com 1.086 lugares, é palco de centenas
de espetáculos por ano: teatro, orquestras e grupos de dança, além de artistas
consagrados.
A Juilliard é uma pérola do fabuloso Lincoln Center, que também se
avizinha à Metropolitan Opera de NY (“Met”), uma das maiores casas de ópera do
mundo. Um enorme órgão de tubos pode ser ouvido no auditório Paul Hall (foto
abaixo), enquanto a dança encontra espaço no Glorya Kauffman, ambos no prédio
da Juilliard.
Paul Hall e seu órgão de tubos |
As exigências para conclusão do curso escolhido são enormes.
Não bastar entrar, há que se vencer uma série enorme de provas, concursos e
obstáculos. O mercado de trabalho, não apenas em NY, mas em todas as mais
importantes instituições de ensino e orquestras, é extremamente competitivo,
especialmente no campo das sinfônicas. Para se ter uma ideia, um antigo contrabaixista
de Boston, Mel Peabody, entrou na Sinfônica de Indianapolis com uma simples
carta de recomendação do maestro Arthur Fiedler (no pós-2ª guerra). Hoje, com
Indianapolis, San Antonio, Denver, Buffalo e outras guindadas ao “grupo B”, de
nível internacional, nunca espere menos do que 150 a 200 inscritos para uma
única vaga de contrabaixo.
Entrada principal, visita a convite, em 2009 |
Deu para se ter uma ideia da grandeza e pujança da
Juilliard School. Prosseguiremos com outra visita em breve, buscando informações
e inspiração para que os voos do Conservatório de Tatuí sejam cada vez mais
altos, seguros e constantes, nesta e nas próximas décadas.
Excelente artigo sobre assunto de triste memória. Necessário clarear mentes equivocadas sobre o que é ditadura! abço.
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