Reunião para a criação das Forças de Paz da ONU |
As Forças
Internacionais de Paz (Peacekeepers) foram criadas pela ONU para atender
países ou regiões vítimas de conflitos e grandes tragédias. A entidade tem
assistido nações desde a Guerra Fria, passando por Nasser, no Egito, além de
Moçambique, Timor Leste e Haiti, cuja missão está há dez anos sob a liderança
brasileira. Foi após o bloqueio de Nasser a um porto israelense, no Canal do
Suez, escorado pelo bloco árabe e a União Soviética, que o Brasil se associou
às Forças, em 1957, ajudando desabrigados, desvalidos e feridos. Em 1988, o
Comitê Nobel concede às Forças de Paz da ONU a Medalha da Paz, pelos serviços
prestados. Em 2001, as FIP recebem outro
Nobel, dividido com o Secretário Geral da ONU Kofi Annan.
Embarque de batalhão do Rio Grande do Sul (FIP) para o Suez |
O Batalhão Suez, composto por militares do Brasil, Canadá, Colômbia,
Dinamarca, Suécia e outros, atuou primeiramente nos conflitos do Oriente Médio
e na Faixa de Gaza. Desde 2004, o Brasil se agregou, com 1.200 homens, às
Forças de Paz no Haiti, sendo o maior contingente militar brasileiro já enviado
ao exterior desde a Segunda Grande Guerra. Desde o desembarque em um dos países
mais flagelados do planeta assumimos a liderança da Força, destacando-nos não
apenas pela atuação de proteção e salvamento quanto pelo tratamento
humanitário. O Haiti foi massacrado por conflitos armados e, em 2010, por um
terremoto de gigantescas proporções que praticamente devastou a nação e deixou
um saldo de mais de 300 mil mortos.
Resgate de feridos pelo terremoto de 2010 |
Uma descontrolada
epidemia de cólera, ao lado de tentativas infrutíferas de eleição de novo
Parlamento pelo Haiti, coincidem com a intenção da ONU de retirar seu pessoal
do país caribenho em 2016. Já passaram pelo Haiti, nesses 10 anos, 30 mil
soldados brasileiros, com um saldo de 22 mortos, a grande maioria
ironicamente vítima do terremoto, e não de batalha. O Brasil gastou, nesses
dez anos, R$ 2,1 bilhões, tendo sido reembolsados pela ONU 35% desse valor um
débito de pouco mais de R$ 1,5 bi, ou seja, algo como R$ 150 milhões ao ano, em
dez anos.
Haitianos amontoados no Acre |
Inúmeros os
méritos da missão de paz dos nossos valorosos ‘boinas azuis’, e, em respeito a
eles, cabe analisar comparativamente alguns números, objeto de matérias e
opiniões recentes na imprensa, que questionam os ‘dividendos políticos’ (sic)
desses gastos (como um hipotético assento no Conselho de Segurança da ONU).
Esqueçamos nossa contribuição enorme de irmãos para com o Haiti, país, aliás,
de onde têm imigrado para o Brasil milhares de refugiados por trilhas de fome e
sujeira, humilhação e roubos, legião cuja 'adoção' agora é objeto de disputa
política entre a capital de São Paulo e o Acre - estado cuja fronteira serve de
‘porteira de imigração’ ilegal, pois é passagem dos ‘coiotes’, traficantes de
pessoas que nos despejam cidadãos haitianos como se fossem vítimas do
holocausto.
Universidade de São Paulo |
Sobre a aparentemente
supérflua cifra de R$ 1,5 bi pagos em dez anos para o Brasil sustentar a
missão, vale compará-la a alguns outros gastos, sem negar a esses outros maior ou menor
importância. Esse é o caso dos 5 bi de orçamento recebidos pela USP apenas em
2013 - e isso em apenas em âmbito exclusivo estadual. Comparando, o gasto
nacional com o Haiti chega a parecer razoavelmente conservador (reiterando que
essa comparação é numérica, e não entra no mérito da importância monumental da
universidade).
Por outro lado, se
trouxermos à tona tão somente o
investimento oficial divulgado para a Copa 2014 no Brasil, vamos
entender que, com óbvios dividendos de natureza eleitoral, abriremos a Copa com
um número de estádios bastante inflado para a necessidade real. Com isso,
chegamos a assombrosos 28 bilhões, com ‘aditivos contratuais’ de 1,5 bi sobre
os R$ 26,5 bi inicialmente previstos (fonte: Ministério dos Esportes) - aquele
plus contratual, tão comum no chamado ‘regime diferenciado’! (Para quem não
sabe, este é o nome elegante para a ‘flexibilização’ da lei das licitações, que possibilitou um
acréscimo de 1,5 bi ao custo previsto para a Copa deste ano. Um extra que equivale ao mesmo
valor dos dez anos da ação humanitária brasileira no Haiti).
Saneamento (sic) em Cuiabá, próximo ao Estádio |
O discurso oficial
que diz “a Copa não é para o mundo, é para o Brasil”, é, claro, um slogan de
efeito estudado não apenas como desculpa para o atraso de 50% das obras, mas
também esforço para convencer o pobre torcedor platônico, que não vai
participar da festa, de que tudo valeu a pena, que a modernidade das
construções e a suntuosidade lhe são servidos como cota do ‘biscoito fino’. Como no carnaval,
uma extravagância que contrasta com o dia a dia pobre em saúde, educação, saneamento,
asfaltamento, transportes e segurança. Às favas ‘o que será, que será’
do pós-Copa, e a manutenção e uso de toda a infraestrutura criada após o último
apito da final.
Medalha Cinquentenária: orgulho |
O
Brasil sustenta sua Força de Paz, soldados bem formados e preparados para o
amparo às populações atingidas. É parte integrante da FIP-ONU, com seus
valorosos membros que arriscam suas vidas pela paz e pelo fim dos conflitos,
orgulhosos de suas ‘boinas azuis’ (green barrets) da ONU. Não houve imensa
contrapartida financeira à importação de profissionais de outros países, nem
perdões de dívidas enormes ou doações e empréstimos quase a fundo perdido do
BNDES. É hora de compararmos o custo da valorosa missão brasileira aos da
corrupção endêmica que sangra os cofres públicos em valores múltiplas vezes
maiores, em proveito pessoal e de interesses escusos. Homenageado pela ABFIP-ONU
com a medalha cinquentenária em 2013, sua maior distinção, senti-me na
obrigação de comentar o que tenho lido e externar minha modesta opinião, em
defesa da honrosa participação da FIP-ONU brasileira não apenas no Haiti, mas
em todo e qualquer conflito ou tragédia, missão de paz que é paradigma de
desprendimento,solidariedade e excelência.
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