O estado
contemplativo é velho conhecido dos antigos monges da Igreja Católica, como bem
descrevem os exercícios espirituais de um anônimo monge beneditino inglês do
século 14, em escritos dirigidos a iniciados: ‘The Cloud of Unknowing’, ou ‘A
nuvem do desconhecimento’ (publicado em português como ‘A nuvem do não saber’).
O autor cita textualmente o conhecido trecho do Evangelho segundo Lucas, 10,
38-40, em que Cristo se refere ao estado contemplativo de Maria, em contraste
com a representação da vida terrena, na pessoa de Marta (“Maria escolheu a
parte certa" disse Ele). A mãe de Cristo estava, segundo o evangelista, em
estado contemplativo, desligada espiritualmente dos laços terrenos, sob a
ausência de pensamentos.
Muito
antes disso, o 24° capítulo do Êxodo descreve Moisés recebendo um chamado
divino, para que galgasse o caminho ao topo de uma montanha, onde foi encoberto
por uma densa nuvem - a do
desconhecimento -, e ali ficou por ela envolto por seis dias, em estado de
absoluta contemplação. Em 398 d.C., em suas confissões, Santo Agostinho também
menciona a ‘nuvem’.
Mahatma Gandhi |
O
brahman-nirvana é o encontro da liberação do ego humano com o deus supremo da
existência, Brahman, em diversas passagens do Baghavad Gita que citam os
ensinamentos de Krishna. O grande líder Mahatma Ghandi (1869-1948), exemplo de
uma das maiores espiritualidades que conhecemos, foi o fundador do estado
moderno da Índia e defensor do Satyagraha, a revolução pela não-violência. Ele
aponta diferenças de conceitos do nirvana entre religiões hinduístas: para os budistas, seria o vazio (‘shunyata’),
enquanto no Baghavad Gita ele representa a paz divina, sendo por isso chamado
brahman-nirvana.
Estátua de Shiva |
No
Brahman-Kumaris, o nirvana seria o estado mais alto de três universos, onde
fica a alma suprema, chamada Shiva. O termo nirvana vem de uma junção de três
fonemas sânscritos (‘ni’, distante, sem; ‘va’, um sopro como o do vento, o
exalar de um perfume; e ‘na’ carrega um sentido de negativa: nunca, não, nada).
Kurt Cobain: Nirvana |
Em 1987,
formou-se em Aberdeen, estado de Washington, EUA, uma banda de rock, chamada
Nirvana, liderada pelo cantor e guitarrista Kurt Cobain e o baixista Krist
Novoselic. Tornou-se um dos mais importantes grupos de sua geração,
arrebanhando fãs e admiradores em todo o mundo, um ícone como Guevara. O
primeiro disco, ‘Smells like teen spirit’ (‘Cheira a espírito adolescente’),
fez algum sucesso. Mas logo depois, ‘Nevermind’ (‘não importa’), de 1991,
popularizou de vez a banda como ‘porta-voz de uma geração’, até a tragédia: em
1994, aos 27 anos de idade, Cobain matou-se com um tiro na cabeça e uma grande
quantidade de drogas no sangue. (Veja abaixo a animação sobre depoimento de Kurt Cobain, colaboração do amigo Felipe Cherubin)
Ainda existem especulações quanto a esse fim, que comoveu milhões de seguidores de Cobain pelo mundo inteiro. A mãe dele, também compondo o retrato da tragédia, carregava as cinzas do filho quando escorregou com a pequena urna, no aeroporto de Heatrow, em Londres, esparramando parte do conteúdo para dentro do respiradouro da calefação. Cobain havia interpretado à sua maneira alucinada a filosofia do nirvana: ‘libertação da dor, do sofrimento e do mundo exterior’.
Ainda existem especulações quanto a esse fim, que comoveu milhões de seguidores de Cobain pelo mundo inteiro. A mãe dele, também compondo o retrato da tragédia, carregava as cinzas do filho quando escorregou com a pequena urna, no aeroporto de Heatrow, em Londres, esparramando parte do conteúdo para dentro do respiradouro da calefação. Cobain havia interpretado à sua maneira alucinada a filosofia do nirvana: ‘libertação da dor, do sofrimento e do mundo exterior’.
Em depoimentos, Cobain falou de seu relacionamento com a mulher, Cortney
Love, também musicista, regado a um consumo sem limites de drogas de todos os
tipos, do LSD aos opiáceos, indo além dos limites ao beber solvente (álcool
destilado de madeira, capaz de matar com a ingestão de simples 30 mL), que
atacava seu estômago de tal forma que chegou a se dopar com heroína por três
dias seguidos, sem dormir, para suportar a dor. Sucediam-se crises de
depressão, ideias mórbidas e de suicídio.
Courtney Love |
Não
faltaram tentativas para ele e Courtney Love procurarem ajuda, após saberem que
seriam pais de uma criança. Em vão. As apresentações em que se acidentava (ou
se automutilava?) eram aterrorizantes, mas, sem sentir dor, gritava, para o
delírio da plateia ensandecida pelo espetáculo selvagem: “eu sou um circo
humano!”
Capa do LP Aneurysm |
Apesar das
crises de depressão, excesso de drogas e um histórico familiar de problemas
mentais, depressão e suicídios, Kurt Cobain tornou-se ídolo de uma juventude
que desconhecia o real significado da palavra nirvana e o inferno pessoal de
seu astro. Títulos das músicas, como ‘Aneurysm’ (doença vascular cerebral),
‘Lithium’ (remédio para depressão bipolar) e seus poemas eram odes de caráter
mórbido e deprimente: “estupre-me, estupre-me, amigo, estupre-me novamente”.
“Minha inspiração interna favorita / eu vou beijar suas feridas abertas /
agradeço sua preocupação / você vai feder e queimar” (em ‘Rape me’). Do punk ao
punk-rock e de lá ao grunge de Seattle, Cobain deixou uma discografia
historicamente importante para o rock. Porém, como ser humano e ‘pensador’ (sic),
foi um lixo desqualificado e prestou um enorme desserviço a pelo menos duas
gerações hipnotizadas.
Foto da perícia do local da morte de Kurt Cobain obtida com teleobjetiva |