Heróis,
críticos, intrigas e anedotas
Richard
Strauss (1864-1949) ridicularizava os críticos, simbolizando-os em e arrastados
naipes de trompas. Pensando neles, orquestrou esses instrumentos com malícia em Ein Heldenleben (Uma Vida de Herói), um poema sinfônico que é uma exaltação
ao super-homem de Nietzsche, mostrando um violino-herói que, seguramente, era
ele mesmo, Strauss. É preciso lembrar que Richard nutria indisfarçável ódio por papai
Franz Strauss, trompista que por sua vez não escondia uma ojeriza mortal por
maestros. Por causa disso, Franz nunca aceitou a carreira de regente do filho
Richard.
Anedota:
um sujeito entrou em uma loja de pássaros e ficou observando aquelas gaiolas
com canários. Em uma delas, havia uma placa que informava: ‘canário cantor, R$
10,00’, e cantava lindamente! Na gaiola vizinha havia outro canário e os
dizeres: canário mudo, R$ 1.000,00. Inconformado, o freguês pergunta ao dono da
loja o porquê de um canário de lindos gorjeios custar apenas R$ 10,00, ao que o
outro, mudo, coitado, sem cantar nada, valia R$ 1.000,00. A explicação do
lojista foi no ponto: é que este segundo não canta – mas rege.
Bernard Shaw |
Raros foram
os críticos que desfrutaram do paraíso do respeito geral dos músicos. Entre as
exceções, destaca-se o dramaturgo e crítico musical irlandês Bernard Shaw
(1856-1950), o qual, a respeito da 9ª Sinfonia de Beethoven (Ode à Alegria),
escreveu que deveria ser proibido executar qualquer outra obra musical no mesmo
programa, a “Nona” se bastava. E que o autor de tal crime deveria ser
preso sem direito a fiança e condenado.
Max Reger |
O
alemão Max Reger (1873-1916), além de compositor, foi organista e pianista de
grande virtuosidade, músico profundamente inspirado mesmo quando não bebia,
costume razoavelmente comum entre os românticos daquela época. Por causa de seu
costume, certo dia Reger leu uma crítica em que um articulista disse que ele não
precisava beber para se inspirar. Reger, furioso, escreveu ao crítico dizendo
que tinha acabado de ler tão maldoso artigo – naquele lugar recôndito para onde
as pessoas se recolhem para resolver, digamos, assuntos... de foro íntimo. E
que, em poucos minutos, aquela crítica teria o destino merecido, deixando à
conclusão do jornalista o futuro da matéria dele. Um século antes de Reger
nascer, Gluck já costumava ser visto ao cravo compondo em seu jardim, garrafas de
champanhe ao redor. Talvez por causa desses excessos etílicos o compositor tivesse
o hábito de bater na cabeça de seus músicos quando os repreendia.
Existem
muitas histórias divertidas sobre críticos. Uma delas conta que, há muito tempo,
um deles preparou um artigo sobre um recital de um pianista brasileiro que acontera
em determinado auditório. Exaltou a destreza do pianista em ‘passagens em tercinas
do segundo movimento’, vocabulário que os músicos evitam usar fora de aulas.
Mas repreendeu certos andamentos e lamentou a interpretação de uma ou outra
passagem. Ironicamente, o programa do recital havia sido mudado. A obra
criticada simplesmente não fora executada. Culpa do despreparo do crítico, que escreveu
o artigo sem ter ido ao evento.
Carlos Imperial, imbatível |
Há
aqueles que não dão a mínima para críticas sobre sua performance e pessoa; pelo
contrário, delas até se aproveitam. O compositor, carnavalesco, político e auto-assumido
cafajeste Carlos Imperial, acusado de plágio por sua marchinha A Praça, costumava
dizer: falem mal, mas falem de mim. Também garboso ao ser mal-falado e suprassumo
da cafonália mundial, o pianista norte-americano Liberace recebeu duros ataques
em um órgão de imprensa, após uma apresentação espalhafatosa no Madison Square
Garden, de NY. Telegrafou depois a cada um dos responsáveis do jornal e ao seu
detrator informando que as críticas o deixaram tão deprimido que havia chorado
copiosamente durante todo o longo caminho de limusine para o banco.
Peça rara: Massenet e Saint-Saëns no mesmo LP |
O
compositor Camille Saint-Saëns (1835-1921) havia perdido a eleição para o
Instituto de França, em 1878, para Jules Massenet (1848-1912). Perguntado sobre
o rival, Saint-Saëns, diplomática e educadamente, respondeu que Massenet era um
músico genial. Quando foi informado de que este último o havia tachado de
compositor medíocre, Saint-Saëns usou de pronto uma rasteira inteligente: disse
ao jornalista que ele, assim como Massenet, nunca dizia a verdade ou o que realmente
pensava.
Gary Karr e sua bike: campus de Hartford |
Indiferentes
à opinião alheia sobre suas performances e pessoas, certos músicos, mesmo que
cobertos por nobres casacas e sóbrias vestes femininas, às vezes escapolem das
regras e não hesitam em lançar mão de expedientes como usar um velho par de
jeans tingido de preto, como fez um dia a já falecida Marylou Speaker, spalla dos segundos violinos da Sinfônica de Boston, que ao entrar no palco escondeu
com seu instrumento a placa de metal do bolso traseiro direito de seus jeans Levis
escurecidos. E passou o concerto inteiro puxando a blusa preta para tampar o
adereço. E o célebre contrabaixista Gary Karr, da Universidade de Hartford,
mandou às favas o perfil sisudo e mandou instalar um rack em sua bicicleta para
levar seu enorme contrabaixo campus afora, sob os maus olhares dos acadêmicos
mais empedernidos.
Aliás,
sobre este instrumento existem algumas dezenas de anedotas. Uma delas conta que
um contrabaixista, após o intervalo, reclamou ao maestro, alto e bom som, que
alguém havia desafinado uma corda de seu instrumento. O maestro: pois afine-a!
O músico respondeu que não disseram quem foi o autor da brincadeira e que não contaram
qual a corda!
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