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domingo, 17 de fevereiro de 2013

O CARNAVAL LONGE DO TRÁFICO, DO JOGO, DA NUDEZ E NA RESSACA DA REPRESSÃO – II




Há algumas décadas, o lança-perfume, tolerado pelas autoridades, povoava os bailes de clubes e de rua. Mistura sob pressão de éter e outras substâncias em um frasco de vidro, era esguichado na foliã, provocando-lhe uma reação ao gelado, momento em que o folião fazia a abordagem para abraçá-la, e, cheirando-lhe o ombro e ela ao seu,  saía pulando de um mundo fechado e rotineiro para outro, o da fantasia, do erotismo e da desinibição. A festa, associada ao álcool, ao lança-perfume e outros estupefacientes, passou a ser uma grande catarse (na filosofia grega, a purificação pela liberação emocional) descontrolada e louca, e terminava frequentemente com os pares de folia sem saber exatamente quem eram um e outro, e muitas vezes até onde acordavam. Hoje, até a nudez dos desfiles, se não castigada, vem sendo gradualmente banida. Os arroubos orgiásticos de Joãosinho Trinta há 20 anos são coisas do passado – e arrisco dizer que indiretamente pela enorme penetração e avanço das igrejas evangélicas nas favelas. O nu está coberto – com ornamentos, mas está. 

O distanciamento do jogo do bicho,  do tráfico e agora o duro cerco aos motoristas que sob efeito de ínfima quantidade de álcool ou droga podem receber voz de prisão levarão as escolas, agora com os olhos no marketing, à ruptura com seu passado. (Longe de mim defender esse passado, muito pelo contrário, neste ano muitas vidas foram salvas neste país, e isso que fique bem claro). Porém, o tema aqui é a festa, à parte leis, religiões e posições pessoais. O fato de uma cultura popular ter estado ligada a um passado de ilicitudes não justifica que para recuperá-la deva-se voltar a andar à margem da lei, mas a ligação do carnaval com a alucinação provocada artificialmente é coisa que vem de suas raízes. Os foliões agora haverão de conviver com essa nova realidade, temendo a prisão, os pontos na carteira e a apreensão de veículos, além das altas multas, estragando-lhes de vez a festa (e o ano). Pena que outras leis que não a Lei Seca não sejam aplicadas também com o mesmo rigor a muitos dos próprios legisladores, em seus desmandos.
2014 virá. Não estranhe se os desfiles das escolas vierem com as agremiações ligeiramente mais murchas, mais encolhidas, e os decadentes sambas de enredo sinalizarem ou deixarem explícito o nome do patrocinador da escola. Ou, ainda, em poucos anos, se as fantasias trouxerem em algum lugar, como nos pilotos de Fórmula I e jogadores de futebol, os logos das empresas patrocinadoras. Quem sabe, no futuro, os carros alegóricos não ostentarão, iluminados por lâmpadas led, os nomes de companhias aéreas, automontadoras, construtoras e bancos privados, seus futuros parceiros? Viver para ver.




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