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sábado, 24 de agosto de 2013
QUE MÚSICA ELETRÔNICA QUE NADA, MANO !!!
O brasileiro tem mania de imitar o que vem de fora do jeito dele, só porque ele
quer, para ficar bonito “na fita”. Veja o tal de “Gospel” brasileiro (de “God spell”,
do inglês Palavra de Deus, Evangelho). O Gospel original surgiu nos EUA por
volta de 1890 em forma de canções e hinos, no seio das comunidades negras
protestantes, nascido dos belíssimos “negro spirituals” (canções religiosas negras)
ainda no século 18, lindos hinos para voz solista e coro cantado nas igrejas.
Os spirituals eram uma adaptação dos hinos luteranos ao ambiente e forma de
cantar do negro, com pitada de blues. Agora, o que a belíssima linhagem Gospel tem
a ver com o pop-light comercial cantado geralmente por mocinhas bonitas com voz
inocente no Brasil? O que tem isso a ver com o Gospel verdadeiro, além do
nome? Nada. (Veja e ouça o Gospel
original abaixo, e a seguir um “negro spiritual”).
A "turma" de Cornélio Pires (ao centro)
Daqui mesmo, o sertanejo universitário, expressão que não explica coisa alguma,
foi importado do nordeste pela peãozada dos canteiros de obras da Grande São
Paulo. O gênero absorveu os vícios da região, foi misturado com a jovem guarda
e a “country music” a bordo de chapéu, cinturão e bota de caubói americano.
Euclides da Cunha (1866-1909), em seu consagrado “Os Sertões”, sobre a Guerra
dos Canudos no interior baiano, imortalizou o filho do campo: “O sertanejo é,
antes de tudo, um forte”. Daí a dizer que essa panelada musical urbana e híbrida
é sertanejo, é tiro no pé. Esse “sertanejo” pop fez sumir as cantigas das
festas juninas e degredou o sertanejo caipira de Cornélio Pires, Jararaca e
Ratinho, Tonico e Tinhoco e um mundão sem fim da gente de raiz.
O incrível Earth, Wind and Fire
O Funk saiu da gíria americana “funky” - nervoso, agitado - e teve origem no
jazz negro dos anos 1950. Na década de 1970 passou a designar um estilo próprio
de pop negro norte-americano, nascido do “Rythm’n’blues”. Dele brotaram o frenético
James Brown, Sly Stone e o fantástico grupo Earth, Wind & Fire. O lema do
funk é o grito de Brown: “free your ass and your mind will follow”: liberte seu
traseiro e sua mente seguirá, algo como “agite-se e curta”. (Veja e ouça abaixo o incrível Sly and the family Stone" com o hit "I wanna take you higher", que "detonou" Woodstock em 1968).
Anitta: nova musa do "funk" brasileiro
Já no Brasil funk é o nome dado a um ritmo de batida repetitiva e sem melodia,
sem a riqueza dos metais, órgãos, progressões harmônicas, vozes afinadas e os
passos de dança insuperáveis do funk dos negros americanos. As TVs, os subúrbios
e morros cariocas e periferias – além dos terríveis sons automotivos – invadem com
Lady Lu (“Soca Checa”), Mc Naldinho e Bella (“Tapinha não Dói”), e a mais
recente Anitta, a dos shortinhos desfiados e reveladores, espécie de “pin-up girl”
sem voz, nem açúcar nem sal. Há ainda a “Surra de Bunda”, o pornofunk (se o
termo não existe, acabei de inventá-lo), do “x-rated” ao mais baixo calão, coisa
de fazer corar profeta de pedra-sabão do Aleijadinho.
Bomb-the-bass, grupo de um homem só
“Música Eletrônica”? Ah, esta é qualquer coisa que agita os “clubbers”, a galera
das casas noturnas: o “Acid House”, o “Electro”, o “Techno”, o “Technopop” e
outros. “Acid House” é música para danceterias gravada em estúdio com
sintetizadores, samplers, baterias eletrônicas e afins. Podem ser superpostas vozes,
gemidos ofegantes, gritos e uivos sensuais. Luzes estroboscópicas giram sobre
as cabeças já alucinadas por uísque com energéticos, além do extasy, droga perigosa
que traz grande excitação e, a reboque, taquicardia e o disparar da pressão sanguínea.
São famosos a cantora Yazz e o Bomb the Bass, grupo que não é feito de pessoas,
apenas foi criado eletronicamente em estúdio. Já technopop é um similar dos
anos 1970, entre cujos “astros” estavam o Radio Activity e a Man Machine.
A "Música eletrônica" dos night clubs brasileiros
O Brasil atropelou na contramão. Nada disso é Música Eletrônica, o uso de recursos
eletrônicos não justifica o nome de um gênero de música séria que já existia de
há muito. Thaddeus Cahill criou o Thelharmonium ainda no final do século 19! E
o Theremin (1920) é um aparelho que altera
ondas de rádio por meio de um osciloscópio, cujo som fascinou até Lênin, o
líder bolchevique. Em 1928, surgia o “Ondas Martenot”, inventado pelo francês
Maurice Martenot, que consistia em um teclado de amplificação controlada por um
oscilador por meio do movimento das mãos sobre captadores de extrema
sensibilidade. O aparelho chegou a ser utilizado por Honnegger, Boulez e
Messiaen, ícones da vanguarda da época. O movimento Música Eletrônica foi
consolidado em 1951, em Colônia, Alemanha, por Beyer e Eimert. Por lá também passaram
Messiaen e John Cage, que compôs uma peça-símbolo chamada “Paisagem Imaginária
nº 1”, mesclando técnicas eletrônicas à chamada Música Concreta, que empregava montagens
de recortes de fitas magnéticas pré-gravadas. A Música Concreta é associada a Pierre
Schaeffer, na Paris da metade do século 20. Em 1954, Stockhausen assumiu o
estúdio de Colônia, criando e adaptando mais aparelhos à Música Eletrônica, e
elevando o nome da cidade alemã ao patamar de grande centro da vanguarda mundial.
(Veja e ouça abaixo “Paisagem Imaginária nº 1, de John Cage: pura música
eletrônica).
Doutores eruditos da "borla e capelo", na vetusta Universidade de Coimbra
Por que no Brasil querem vender gato por lebre, reinventar a pólvora ou a roda –
e tudo isso com nome em inglês, para ficar mais “fashion”? Estranho e contraditório,
porque esse mesmo país cunhou a expressão “música erudita”, que só existe aqui
- mundo afora é música clássica, mesmo, e isso, o que é correto, deveriam equiparar.
Para piorar, os rótulos de gêneros da ‘estranja’ aqui reproduzidos,
diferentemente dos conteúdos originais, revelam um produto que não tem nada a
ver com o original e que, no mais das vezes, é de muito pouco valor musical ou
até lixo irreciclável.
[Fonte:
Dicionário de Termos e Expressões da Música, do autor. SP: Ed. 34, 2ª Ed.]
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