Eloise Mental Hospital |
Em 1875, o psiquiatra francês Dr. Chonet
reportou casos de cura pela música, como o de uma jovem epilética. Em 1936, o
Dr. Altschuller do Eloise Mental Hospital, de Detroit, EUA, iniciou estudos
sobre reabilitação de enfermos com música, e em 1944, o sueco Aleks Pontvik
criou o Instituto de Terapia Musical, reportando curas que vão da asma à
hipertensão. René de Castro, no Diário de São Paulo de 1° de novembro de 1951,
chega a dividir a ideia em categorias: violino para os deprimidos, flauta para
os tuberculosos, Beethoven para reumáticos e Mozart para cardíacos.
Hal Lingerman publicou As
Energias Curativas da Música, em que sugere, baseado em suas pesquisas, obras para
as mais diversas horas do dia. Seu texto aconselha, para os que se levantam,
alguma música calma, que prepare o primeiro contato com a dura realidade do dia
a dia; para os que apenas acordam mas querem tirar mais uma soneca, algo como
os concertos para flauta de Vivaldi ou o Concerto para Clarineta de Mozart. No
acompanhamento musical de um jantar, para boa digestão, alerta que convém evitar percussão
pesada, como tímpanos e tambores diversos, além de metais como trombones e trompetes.
E sugere para os bons repastos o Concerto para Piano nº 1 de Chopin, além, claro, da
Música para Refeições, de Telemann.
Após um dia estafante de
trabalho, ainda segundo Lingerman, coisas alegres e suaves, como o Canon de
Pachelbel ou o Clair de Lune, de Debussy. Finalmente, como recurso para
combater um dos males que afligem parte da humanidade, a insônia, subproduto do
ritmo de vida neurótico e barulhento das metrópoles, Lingerman recomenda o Prelúdio
à Tarde de Um Fauno, de Debussy, ou o Acalanto de Brahms. Mas tiro e queda mesmo, diz, seria a Ária da Corda Sol, de Bach - garantia de um sono
verdadeiramente relaxante. Diante desses argumentos, alguém pode concluir que a
felicidade do dia parece caber em um simples e único CD de áudio.
Gênio da física apaixonado por
música, Albert Einstein, criador da Teoria da Relatividade e um dos mais
poderosos cérebros já nascidos neste planeta, adorava seu violino, que
costumava tocar para relaxar (ao ouvir Yehudi Menuhin pela primeira vez,
Einstein disse que passou a ter convicção ainda mais profunda de que Deus existe).
Tocava seu violino enquanto maquinava cálculos e teorias tão abstratos quanto inalcançáveis
para os pobres mortais. Revolucionou a física e o pensamento científico
modernos, e não era um músico medíocre, a se depreender das raríssimas gravações
disponíveis, como uma performance ao violino com acompanhamento de piano, bastante
musical. Parece que só não foi um ótimo violinista porque a dedicação à física não
lhe dava o tempo de praticar o mínimo, que na arte musical não é pouco. Prova de que inteligência e talento
musical não estão necessariamente divorciados, até pelo contrário, costumam caminhar
de mãos dadas.
Josquin des Prés |
Um dos primeiros compositores
que souberam aproveitar seus dotes artísticos para arrancar dinheiro de reis,
papas e nobres, ao mesmo tempo em que produzia grande número de encomendas para
particulares, foi o renascentista Josquin des Prés (1440-1521), da Picardia
francesa, que viveu na Itália. Josquin chegou a receber encomendas de outros países da
Europa para as mais diversas ocasiões e finalidades. Temperamental, mesmo solicitado frequentemente,
não se descuidava do lazer, compondo apenas quando dava na telha, descumprindo caprichosamente
boa parte dos prazos.
A Igreja muito utilizou as cativantes
propriedades espirituais da Música. Ouça um bom canto gregoriano, do século VI,
vozes graves e sinuosos melismas (arabescos melódicos ornamentais). Esses cantos tinham a singular
propriedade de prender a atenção dos fiéis durante o culto, elevando seus espíritos
à comunhão com Deus. Também chamado cantochão, o canto gregoriano remonta à época do Papa Gregório I, que normatizou
a música religiosa. Nada a ver com outro Papa Gregório, o XIII, que por sua vez decretou
novo calendário, escamoteando para isso 11 dias de nossa História e fazendo
conta de chegada com o ano bissexto. A música, antes subjugada ao poder da
religião, passou a progredir fora da Igreja durante o classicismo, quando na
pressa cega de escapar das amarras eclesiásticas infelizmente foi caindo nas
malhas de governantes de vários matizes e ambiciosos empresários.
Banda de rock de padres, em Milwaukee |
Não é à toa que muitas igrejas
que agora proliferam no mundo, a reboque da propaganda e da mídia, utilizam teclados,
guitarras, baterias e canções de louvor para cativar seus jovens frequentadores,
antigo privilégio quase exclusivo de certos segmentos evangélicos, desde Lutero
e os grandes compositores protestantes, como Bach. Já um padre chamado Marcelo
Rossi, astro carismático de quase dois metros de altura, vendeu milhões de
cópias de CDs com as músicas cantadas e dançadas em seus shows-missas (e como
se trata de certo tipo de modismo, um astro tanto pode ser seduzido
por alguma TV de olho em seu sucesso quanto ter caído no esquecimento em algum
tempo, destino frequente de estrelas de rápida ascensão).
Juca Chaves disse que uma coisa
pode ser igual à outra: após um show em Salvador, em 1999, um fã perguntou-lhe
por que ele não havia feito qualquer piada sobre o todo-poderoso senador baiano
Antonio Carlos Magalhães. Juca respondeu que só contava anedotas sobre
política, nunca sobre religião. Por fim, rendendo-se à TV e à mídia eletrônica,
a música foi perdendo qualidade e se transvestindo, passando
a moldar o gosto do povo. (Continua na próxima edição)
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