Monges do Mosteiro de São Bento |
Concílio Vaticano II |
égio, ainda peguei a missa em latim:
No Colégio, de formação jesuíta, tínhamos aula de latim, creio que até um ano após minha saída da escola – outra perda irreparável para as gerações que se seguiram, pois deixaram de prover uma rica fonte de conhecimento para os alunos. O lema mens sana in corpore sana (mente sã em corpo sadio) estava nas paredes e no vestíbulo (lat.: vestibülum, pórtico). Meu severo professor não apenas nos incutia o latim como também o que fosse ligado à história da chamada “língua morta” (morta?), como o soneto Língua Portuguesa, de Olavo Bilac (1865-1918): “Última flor do Lácio, inculta e bela / és a um tempo esplendor e sepultura / ouro nativo, que na ganga impura / a bruta mina entre os cascalhos vela...”. Pois aquela última flor do Lácio não é senão nossa língua cantada por Bilac, a última que brotou do latim vulgar daquela região da Itália (Lazio). E tudo recitávamos de cor, um a um, subindo no púlpito por vez cada um, transpirando com medo de errar ou tropeçar (essa talvez tenha sido minha estreia contra o chamado stage fright, ou medo de palco).
Ilustração de Gustave Dore para O Inferno, de Dante |
Revertere ad Locum Tuum |
Meu latim básico tornou-se uma peça a mais na vida, uma ferramenta que ajuda em tudo, até compreender nossa língua. Mesmo nos EUA, ganhei uma disputa em que ninguém acertou a questão – ali constava a palavra nullipara -, e levei um ponto dos mais difíceis, pois se o latim aqui no Brasil é “língua morta”, lá, então, nem chegou a nascer. Nem mesmo na área do direito, pois que lá é o anglo-saxão, enquanto aqui seguimos o greco-romano. Pois cravei nullipara como simples dedução minha: nullus, nulo, nunca, e para, do verbo parere ou parir, o que me levou a cravar a definição: mulher que nunca teve filhos. Os dísticos latinos são lindos, mas o povo muitas vezes não sabe o que significam: non dvcor, dvco, ou seja, não sou conduzido, conduzo, lema da flâmula do brasão da cidade de São Paulo, assim como o de Tatuí, Per ardvua surrexi (ergui-me por dificuldades), símbolo da luta desde o estabelecimento do vilarejo até a fundação do município, em 11 de agosto de 1826. Ao se passar por algum pórtico de um cemitério, uma frase emblemática pode não ser compreendida: Revertere ad locum tuum; porém, trata-se de nada mais do que um acolhedor “voltarás para o lugar de onde viestes”. A bandeira de Minas ostenta o glorioso lema latino que se tornou símbolo da Inconfidência: Libertas quæ sera tamen: Liberdade ainda que tardia!
Em direito, nem se fale. Não há ministro do STF, desembargador ou magistrado (aliás, palavras advindas de minister e magister, conselheiro e mestre, em latim) que não produza grande efeito às suas sentenças, às vezes de enorme erudição, em meio a doutrinas (lat.: doctrina, ensino) e jurisprudência (de juris, direito). Pois é na leitura dos autos e nas oitivas (oitiva: do lat.: audire, ouvir), onde ele logo vê o chamado fumus boni juris, a conhecida “fumaça” do bom direito, ou seja, quando transparece a luz da sugestão para a decisão. Ipso litero, ou seja, literalmente, o magistrado sabe que veritas evidens non probanda, quer dizer, a verdade em evidência não precisa ser provada, e que verba volant, scripta manent – palavras voam, mas a escrita permanece. Sabe, quando urge, tomar decisão inaudita altera pars (sem ouvir a outra parte).
Eugenia Uniflora |
Amen.
Beethoven, Missa Solemnis. Coro
de 260 cantores: London Philarmonic Choir, London Symphony Choir, regência de
Sir Colin Davis e solistas. Total, com entrevista: 1h39. Início da execução: aos 07min.
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