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sexta-feira, 26 de setembro de 2014

BILL HALEY E O BALANÇO DAS URNAS

“One, two, three o'clock, four o'clock rock / five, six, seven o'clock, eight o'clock rock / nine, ten, eleven o'clock, twelve o'clock rock / we're gonna rock around the clock tonight”. Em 1955, quais de nossos pais ou avós não dançaram ou curtiram Bill Haley (pronuncia-se 'rêilei') e seus Cometas, o ‘rock’ da classe média branca, destilado das ricas origens afro-americanas, ritmo que mudou o mundo? Devem a ele Elvis Presley, The Beatles e uma legião de outros artistas. “Vista seu belo vestido, docinho, nós vamos nos divertir quando o relógio bater” (Trad. livre do autor). “Nós vamos dançar ao rodar do relógio esta noite / vamos dançar, dançar, dançar até raiar forte a luz do dia / nós vamos dançar, vamos ao rodar do relógio esta noite” (T. do A.). (Veja e ouça abaixo "Rock around the clock")


O balanço de Haley chegou à classe média brasileira, inspirou a Jovem Guarda e influenciou toda a nossa música popular, notadamente via Tropicalismo, e foi tema de novelas e inúmeros filmes. ‘Rock’ não quer dizer ‘pedra’, é um verbo que significa balançar, na dança às vezes plena de estripulias, saltos, malabarismos com as mocinhas de vestidinhos pregueados e pernas para o ar. E “Rock’a’by baby / on the tree top / when the wind blows / the cradle will rock…” é letra de uma cantiga de ninar tradicional dos EUA, que eu cantava para meus filhos, segredo do bom embalar: “Balança, bebê / sobre o topo da árvore / quando o vento sopra o bercinho balança / se o galho se quebra o bercinho cai / com ele o bebê, e tudo se vai” (T. do A.).


Haley e sua dança de números vieram-me à mente na semana que se passou, ao assistir na TV a uma reportagem sobre uma pesquisa eleitoral brasileira. Onde será que duas mil pessoas foram entrevistadas? A pesquisa aconteceu via telefone ou nas ruas? Mais: a listagem dos candidatos estava em um círculo a ser girado e entregue à livre escolha do paciente (em duplo sentido) da entrevista? Ou estava em ordem alfabética ou trocada, favorecendo algum nome? Mais importante: o método atende proporcionalmente ao universo de eleitores segundo sua distribuição pelo país? (Cada estado da União, classes sociais, a formação escolar e outros parâmetros fundamentais?).

Muitos me perguntam: "você por acaso já foi entrevistado? Pois eu nunca”. Eu tive a infelicidade de ter sido, em uma eleição para prefeito de São Paulo. Perto de casa, uma senhora me parou, e com o famoso ‘disco aleatório’, sem gira-lo, o dedo em cima do nome de um candidato, então tido como  favorito, ao invés de me mandar escolher, perguntou-me: “o senhor votaria neste candidato?”. A pesquisa estava viciada. Disse apenas adeus. Naquele ano, o nome que foi apontado era favorito na pesquisa, a boa distância da segunda colocada, mas perdeu por uma ‘súbita mudança’ (sic) nos últimos 3 dias, um passe de mágica. Ungida, a Prefeita tomou posse ante a surpresa da enorme reversão das expectativas.

Ainda nesta semana que passou, um importante instituto de pesquisas eleitorais, por encomenda de um grande jornal brasileiro e uma das maiores empresas de televisão aberta, interpretaram os mesmos números de formas diferentes: de acordo com o jornal, uma candidata “amplia vantagem” (manchete de primeira página) sobre sua concorrente, em vista de um ‘acréscimo’ duvidoso em qualquer estatística: coisa da ordem de 2% a mais para uma e 1% a menos para outra. Por sua vez, a emissora noticiou que as posições das duas supostamente mais bem colocadas se mantiveram, e ressaltou o mais importante, o virtual empate no segundo turno, coisa que não mereceu destaque na manchete do jornal. E nada de outros candidatos na chamada!

Nação de primeiríssimo mundo, o Reino Unido realizou recentemente um referendo sobre a independência da Escócia. As pesquisas, feitas por órgãos independentes e confiáveis em um país tido como absolutamente sério mostravam uma constante: 4% de diferença em favor do ‘não’. Mas o resultado final passou ao largo das duas maiores pesquisas: a diferença entre o ‘sim’e o ‘não’ foi de 10% - um ‘erro’ de 6%, um enorme desvio estatístico às vésperas do pleito! Isso, em um país tão sério que o líder do voto pelo ‘não’ no parlamento escocês, Alex Salmond, imediatamente reconheceu a derrota e pediu aos compatriotas que a acatassem, e apoiassem a permanência do país no Reino Unido.

Faço breve paralelo com a economia, ciência econômica por definição, que interpreta números. Pois números são sujeitos a visões e visões, tanto que há escolas como as de Cambridge, do MIT, de Harvard ou de Chicago, que de certa forma utilizam suas formas de pensar os números de maneira bem particular, sob óticas e ideologias diferentes, até rivalizando-se. Voltando às nossas pesquisas, não vou fazer ilações (por falta confessa de elementos) sobre métodos, confiabilidade, margens de erro e menos ainda a lisura desses levantamentos, encomendados por órgãos de imprensa, confederações e outros.


Se na economia há números voláteis, cifras que se reportam a situações reais, na política, mesmo que ouvindo apenas 2.000 pessoas de uma população de mais 142 milhões de eleitores (0,0014%, ou uma opinião para cada 17 mil votantes!), os resultados carregam o discreto charme da profecia. O melhor a fazer, portanto, é esquecer a “Lei de Gérson” (“o brasileiro gosta de levar vantagem em tudo”) pensar e usar o coração na hora de votar, deixando o resultado à decisão do povo, entre todos os candidatos. Do balanço do Bill Haley, fiquemos com a música que o elegeu estrela, com seu ministério de incríveis “Cometas”.

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