O famoso caviar Petrossian |
Para entender o Brasil de hoje, os
neologismos políticos e a tendência de rotular pensamentos
e comportamentos, fui pesquisar o significado de “direita coxinha”, “esquerda caviar” e “pão com ovo”, além de outras denominações. Achei por bem consultar os universitários, como dizia um apresentador de TV, e indaguei minha filha Isabela, aluna da USP, que é o melhor lugar para se pesquisar e criar teorias, mas fértil também nos neologismos e modismos. Cheguei a uma breve Taxonomia do Coxinha, do Caviar e do Pão com Ovo.
e comportamentos, fui pesquisar o significado de “direita coxinha”, “esquerda caviar” e “pão com ovo”, além de outras denominações. Achei por bem consultar os universitários, como dizia um apresentador de TV, e indaguei minha filha Isabela, aluna da USP, que é o melhor lugar para se pesquisar e criar teorias, mas fértil também nos neologismos e modismos. Cheguei a uma breve Taxonomia do Coxinha, do Caviar e do Pão com Ovo.
Gráfico taxonômico |
Taxonomia, segundo o Houaiss, é “ciência
que lida com a descrição, identificação e classificação dos organismos”, e no
caso brasileiro, serve também para classificar produtos alimentícios animais. Esquerda
caviar (gauche caviar) é - claro - expressão francesa dos anos 1980, e se refere aos
‘socialistas’ que desfrutam dos melhores vinhos e iguarias finas nos bistrôs e
cafés parisienses.
Assembleia Francesa pré-revolucionária |
O conceito histórico de esquerda e direita
foi esboçado na Assembleia Francesa pré-revolução: os nobres e a alta aristocracia
partidários do Império de Napoleão sentavam-se à direita, para evitar atritos
com a ala contrária, progressista e republicana - tal qual nos estádios de
futebol hoje se aglomeram torcidas em lados diferentes, para evitar tumultos.
Monarquia-República quase 230 anos atrás, Corinthians-Palmeiras hoje.
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A III Internacional Comunista |
A II Internacional Socialista (1889)
isolou os esquerdistas, diagnosticando-os desde então com alguma coisa como a “doença infantil” do comunismo, que Lênin viria expor mais adiante.
Enxergavam o chamado “sarampo” nos social-democratas, trabalhistas e liberais.
A III Internacional (1919/1943), chamada Comunista (Komintern), definiu quem é quem
no movimento e radicalizou posições.
Anarquistas italianos |
Curiosamente, a social-democracia, que já
andou de braços com socialistas no passado, é expressão que faz a nova esquerda
brasileira ter arrepios, jogando-a na vala comum da “direita coxinha”, essa
disputa entre quitutes de frangos e ovas de peixes (no caso, o caviar dos
esturjões), classificação que poderíamos dizer político-estruturalista-culinária. Essa “direita
coxinha” refere-se aos que não comungam a integridade dos mandamentos, nunca
escritos, da nova esquerda. Tutto sociale-democrazia, diriam hoje os anarquistas italianos do passado, jogando a nova esquerda e os coxinhas em um mesmo saco (o que é
isso, companheiro?). Já o “esquerdopata”, outro neologismo, teria o perfil do socialismo utópico de certos
filósofos e acadêmicos.
O “direita coxinha” é conservador e tem
imagem e hábitos burgueses, enquanto a “direita pão com ovo” fica com as
migalhas da parca distribuição de riqueza e recente maior acesso aos bens de consumo,
mas nunca vai concretizar seus sonhos de ser milionária ou grande empresária
capitalista. Bem como a cabrocha em ascensão social do Chico Buarque: “Você era a mais bonita das
cabrochas desta ala / você era a favorita onde eu era mestre-sala / hoje a gente nem se fala / mas a festa continua / suas noites são de gala / nosso samba ainda é na rua” (Veja e ouça abaixo).
O XX Congresso do Partido Comunista da URSS |
O Brasil seguiu a reboque das
tendências da III Internacional e acompanhou o “racha” do XX Congresso do
Partido Comunista da URSS. Aqui, partidos socialistas e comunistas
dividiram-se, e cada parte subdividiu-se em tendências. Porém, com a
redemocratização e a legalização dos partidos proscritos, o comunismo perdeu
seu sentido histórico: o socialismo implantado pela ditadura do proletariado
(classe operária), o fim do poder econômico, a implantação de um partido único
e a propriedade coletiva dos meios de produção. Comunismo e fascismo, goste você ou
não de qualquer um deles (ou ambos), não são designações superficiais, vagas
nem adjetivos. São filosofias baseadas em vasta literatura e estudos, tratados,
discussões, e não tendências dispersas e self-service como simplesmente dizer-se (ou de alguém) “de esquerda” ou “de direita”.
Marx e Engels, autores do Manifesto Comunista |
Uma vez registrados na Justiça Eleitoral
como partidos legais, disputam pelo voto cargos eletivos e aceitam ou pleiteiam até mesmo posições de
confiança em governos à sua direita. Do comunismo ficou apenas o nome e a grife, venceu-o
o interesse pelo poder de seus filiados e partidos, esquecidos os ideais de
Marx, Engels e Lênin.
É oportuno reiterar: o comunismo nunca ameaçou de verdade o Brasil, e isso a história e documentos liberados recentemente (aos milhares) pelos EUA revelam: ele foi um “fantasma” exportado para apavorar a família brasileira e suas Forças Armadas, um ‘Gasparzinho do mal’ criado e alimentado pelo exterior e propagado no Brasil por meio de cooperações sociais e estudantis não muito "canônicas" (como a Aliança para o Progresso e o MEC-Usaid). Jango e sua pueril aproximação com o sindicalismo, brincadeira se comparada nos dias de hoje com alguns partidos e as centrais sindicais, não ameaçava coisa alguma e nem sabia o que era comunismo. Seu fatídico e histórico Comício da Central do Brasil hoje seria algo light, coisa cotidiana. Nem o singelo e naïve (se comparado aos dos dias de hoje) discurso do deputado Márcio Moreira Alves poderia ser usado como estopim para a derrubada da democracia, ao lado do comício de Jango. Foi uma questão tática, como foi a informação vazada sobre a "derrama", para o início da derrocada da Inconfidência Mineira - "hoje é o dia do meu batizado", foi a senha dos inconfidentes.
É oportuno reiterar: o comunismo nunca ameaçou de verdade o Brasil, e isso a história e documentos liberados recentemente (aos milhares) pelos EUA revelam: ele foi um “fantasma” exportado para apavorar a família brasileira e suas Forças Armadas, um ‘Gasparzinho do mal’ criado e alimentado pelo exterior e propagado no Brasil por meio de cooperações sociais e estudantis não muito "canônicas" (como a Aliança para o Progresso e o MEC-Usaid). Jango e sua pueril aproximação com o sindicalismo, brincadeira se comparada nos dias de hoje com alguns partidos e as centrais sindicais, não ameaçava coisa alguma e nem sabia o que era comunismo. Seu fatídico e histórico Comício da Central do Brasil hoje seria algo light, coisa cotidiana.
Trama do golpe: Carlos Lacerda, Gen. Cordeiro de Farias e o US Gen. Vernon Walters, frequentador da casa de Castelo Branco antes, durante e depois de 1964 |
Nos anos pré-1964 houve forte presença
de militares (Gen. Vernon Walters, adido militar no Brasil, vice-presidente da
CIA) e diplomatas americanos (Lincoln Gordon, embaixador, um dos articuladores
do golpe e implantador da "Aliança"). Recentemente, documentos sobre os anos 1970 liberados pelos EUA e entregues à Casa Civil da Presidência e à Comissão da Verdade mostram que a "inteligência" e o governo norte-americanos eram informados sobre os desaparecidos e mortos pela repressão - coisa que no Brasil era uma incógnita devido à censura total. Os EUA buscavam o controle tático da América Latina na guerra fria contra a
URSS. E foi Lincoln Gordon, no Salão Oval da Casa Branca, quem recebeu US$ 8 milhões (uma fortuna, há mais de 50 anos: U$ 62 mi, ou R$ 224.000.000) e o aval para dar luz verde aos militares brasileiros para desencadear o golpe, em 1964. Com a promessa de que a Casa Branca reconheceria o novo regime no dia seguinte. (Tudo documentado nos papéis entregues há dias - era julho de 2015 - ao governo brasileiro por ordem de Barak Obama).
Goulash |
Por fim, a criatividade política brasileira
abre caminho para desdobrar-se até em novas culinárias. Não preciso dizer que
não compartilho desses rótulos e acho infantis e ridículas as interpretações
depreciativas de esquerda e direita de que se servem à mesa: “caviar”,
“coxinha” e “pão com ovo”. Não fosse a enorme diferença de preço entre as
mercadorias, seria algum meio termo político uma mistura dessas iguarias? Isso, sem falar no mais recente "pão com mortadela", o manifestante profissional ou de cabresto, que vai às ruas a troco de uma ajuda de custo mais um lanche de pão com mortadela.
Pizza de frango com Catupiry |
Afinal, em um país onde se come pizza de
frango com Catupiry até em bons restaurantes (perdono, vecchia Italia), poderia haver até coxinha com caviar e
ovo. Um pot-pourri, ola odrida, goulash (misturada de panela)! O grande Jackson do Pandeiro já
cantava: “...chicletes eu misturo com banana / e o meu samba vai ficar assim”. (Veja e ouça abaixo)
Excelente reflexão. Daria uma boa aula de História ou Atualidades. Gostei muito! parabéns!
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