Marília, por Alberto da Veiga Guignard |
Marília: “Ali Dirceu esperava
/ para me levar consigo / e ali sofreu a prisão. / Mandarás aos surdos deuses /
novos suspiros em vão”. Dirceu: “Por morto, Marília, aqui me reputo / mil vezes
escuto / o som do arrastado e duro grilhão”. Os célebres versos de Tomás
Antonio Gonzaga (1744/1810), grande poeta do arcadismo luso-brasileiro nascido
em Portugal, figura ímpar da Inconfidência Mineira, foram endereçados a Maria
Dorotéia Joaquina de Seixas, sua “Marília de Dirceu”, no ano em que o poeta foi
exilado e partiu para Moçambique, onde viria a morrer.
Marília é cantada como a pastora Amarilis desde Virgílio, poeta romano (70/19 a.C.), e recontada pelo italiano Guarini (1538/1602), cuja “Marília” o havia ensinado a “amar amargamente”! O nome Marília já fora, bem antes de Gonzaga, o da musa inspiradora de um século inteiro.
Veja e ouça a diva Cecilia Bartoli, cantando a Amarilli de Giulio Caccini (1551-1618)
Dirceu: foto Abril/Veja |
José Dirceu de
Oliveira e Silva, nascido em Passa-Quatro, MG, é homem estudado: cursou direito na PUC/SP, embora não tenha concluído. Mas a paixão do jovem, na verdade, inclinava-se fortemente
para a política. Seduzido pela resistência à ditadura desde 1965, leu Marx,
Engels, Lênin e Trotski, e deixou-se encantar por Carlos Marighella, afinado
com a guerrilha de Fidel e Che.
O incendiário Daniel Cohn-Bendit, "Le rouge" |
Tendo como ídolo o alemão Daniel
Cohn-Bendit (conhecido na França de 1968 como “Dany, o vermelho”), que ateou
fogo nos estudantes de todo o mundo com seu charme revolucionário, Dirceu,
então presidente da UNE, foi preso no Congresso de Ibiúna - um encontro de
organização tão incompetente que se esqueceu de que o comércio local não daria
conta da explosão absurda da demanda por pães, margarina e provavelmente muita
mortadela e cerveja para mais de 1.200 jovens, o que chamou a atenção da
polícia.
A prisão dos estudantes no congresso da UNE em 1969 |
Preso ali, em 1968, ele foi moeda de troca do resgate do embaixador americano Charles Burke Elbrick, ação espetacular de
um grupo armado que culminou com a libertação de 13 presos políticos. (Dirceu,
portanto, nunca foi “expatriado”, como diz, e sim libertado para Cuba por seus companheiros
de luta).
Clara Becker,. a "Marília" de José Dirceu. Foto de Marco Rodrigues |
Em 1971,
reingressou ilegamente no país, mudando de feições após uma cirurgia plástica
feita em Havana. Com novos documentos, foi para Cruzeiro do Oeste, no Paraná,
onde se casou com Clara Becker – com o mérito absurdo de, com frieza e
inteligência, com ela ter convivido maritalmente sem revelar seus segredos,
tarefa praticamente impossível para qualquer homem comum. Pois Clara foi, por
anos, a Marília de José Dirceu. Clandestino, o dândi da estudantada nunca deve
ter empunhado uma arma.
Correção: Ele estudou direito na PUC-SP, porém não chegou a concluir o curso, e justamente por isso não terá direito a prisão com cela especial.
ResponderExcluirVer comentário abaixo.
ExcluirAgradeço e retificarei. Quanto à prisão especial, ele não teria direito de qualquer forma, porque este é um instituto da prisão tenporária ou preventiva. Condenado em última instância (caso do Dirceu) o cidadão "especial " passa à cela comum.
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