Lênin |
O jovem Dirceu foi esquerdista, e
sonhava em se tornar comunista, conforme ensinou o mestre Lênin: “o esquerdismo
é a doença infantil do comunismo”. Dificilmente ele chegou a ser comunista,
porém mesmo esquerdista já tinha traços do pior efeito colateral do comunismo:
o stalinismo, o culto à personalidade, a prepotência, a censura, a manobra
personalista da estudantada: “eu organizo o movimento / eu oriento o carnaval /
eu inauguro o monumento no Planalto Central do país”, como festejou Caetano, em
sua imortal “Tropicália”.
Pois o já adulto Dirceu
inaugurou-se em Brasília, sob o manto acolhedor da democracia – regime que,
para Stalin, era pernicioso para a classe operária e a causa comunista.
Passados os anos, Dirceu logrou entranhar-se nos intestinos do poder, logo
sendo mordido pela chamada “Mosca Azul” – aliás, título de um livro de meu
primo Frei Betto (escrito após abandonar os círculos do poder palaciano). Fora
do governo, dono de preciosas inside
informations, Dirceu transformou-se em lobista do capital internacional que
tanto combatera: a revista Piauí levou uma repórter em viagem de negócios com
ele por vários países, viu as polpudas comissões para intermediar gordos
contratos que manteriam por longo tempo o ex-enfant térrible muito bem de vida - não fosse a algazarra
financeira do poder, no passado, que levou o ex-líder gauche às barras do STF, onde foi indiciado por graves acusações,
sendo afinal condenado. Julgando-se um cidadão acima de qualquer suspeita e da
lei, esbravejou que entregar seu passaporte seria uma ofensa aos seus
direitos! – esquecendo-se de que todos
os demais cidadãos do país, por lei, podem ser obrigados a fazê-lo, mesmo antes
de qualquer condenação.
Stalin: O "Guia Genial dos Povos" |
Mas o impossível
acontece: talvez Dirceu tenha sido o único no mundo que conseguiu ser ao mesmo
tempo lobista do capital estrangeiro e arauto do discurso stalinista. Sim,
porque Stalin foi um Luís XIV (“O Estado sou eu”) a brandir a foice e o
martelo. Para Dirceu, o STF, a mais alta corte do país, que vai começar a virar
a página do passado e é nossa salvaguarda moral, é “tribunal de exceção”, seu julgamento é “político”, colocando até mesmo sob suspeição os ministros que
o julgam (sob Stalin, apenas por isso ele já estaria na masmorra). E promete
“recorrer” até à OEA (e quem sabe ao Vaticano ou ao Juízo Final, talvez?).
Stalin foi mais coerente: cometeu genocídios, censurou, apagou das fotografias
seus ex-companheiros expurgados, mas foi fiel aos seus dogmas absolutistas até
o fim.
“A
quanto chega a pena forte! / Pesa-me a vida, desejo a morte”, cantou o Dirceu
de Marília, a Marília de um verdadeiro revolucionário, o poeta Tomás Antonio Gonzaga.
[Para quem se interessar por
uma boa gravação das 12 modinhas compostas sobre poemas de Tomás Antonio
Gonzaga sobre Marília de Dirceu, recomendo o CD Tempo Breve que Passaste, com a
bela voz da soprano Marília (outra!) Vargas, e os excelentes Ricardo Kanji,
sopros de época, Rosana Lanzelotte, pianoforte, Maria Alice Brandão, violoncelo
barroco, e Guilherme de Camargo, cordas dedilhadas em instrumentos de época. O
contato pode também ser feito pelo site www.mariliavargas.com]
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