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sexta-feira, 14 de agosto de 2015

HIROSHIMA, MEU AMOR

Poster original
Hiroshima mon amour é um filme de 1959 dirigido pelo cineasta francês Alain Resnais, com roteiro da escritora franco-vietnamita Marguerite Duras. Em japonês, o subtítulo complementa o sentido da obra-prima: “Um affair de 24 horas”. Foi o grande marco da Nouvelle Vague francesa, movimento que inspirou o Cinema Novo brasileiro de Glauber Rocha, Cacá Diegues e Joaquim Pedro.

A trama aborda uma neurótica relação de um dia e meio entre “Ela”, uma atriz francesa (interpretada por Emmanuelle Riva), e “Ele”, arquiteto japonês (Eiji Okada). São intensas e neuróticas conversas, diálogos plenos de cortes para inserções de cenas tenebrosas que levam o público a alterar a respiração. Resnais haveria de repetir essa técnica cinematográfica de inserir fatos passados a momentos presentes ao menos mais uma vez, em “O ano passado em Marienbad” (1961). Essas alternâncias entre um estranho caso de amor imaginário e trechos reais de documentários sobre os efeitos da bomba lançada sobre Hiroshima chegam a provocar náusea, como na cena em que uma mulher, em frente ao espelho, passa a mão nos cabelos, e esses lhe caem aos tufos, efeito decorrente da pós-hecatombe nuclear.

Os diálogos entre Ela e Ele costuram as cenas românticas com tensão. Ele, cuja família sucumbira no dia fatídico, dizia que Ela ignorava tudo, não sabia nada, enquanto Ela murmurava, separando as sílabas: “Hi-ro-shi-ma”. No passado, por ter tido um caso com um soldado alemão na França, Ela havia sido execrada e humilhada, e teve a cabeça raspada como punição, fato que se associa com facilidade à cena real da vítima com os cabelos em queda.

Alain Resnais
Contratado para fazer um breve documentário, Resnais, enfant térrible, exigiu, sem esperar êxito, que o roteiro fosse escrito por Duras e as cenas fossem gravadas na França e no Japão. A produção franco-nipônica aceitou as exigências do cineasta, e o deixou livre para criar com a roteirista. O cinema começaria, a partir daí, a trilhar novos rumos. O ícone Jean-Luc Goddard disse que o filme parecia um diálogo entre Faulkner (escritor) e Stravinsky (compositor). O alemão Eric Rohmer vaticinou que “em coisa de trinta anos saberemos que ‘Hiroshima’ foi o filme mais importante feito após a II Guerra”. O respeitado François Truffaut disse que, depois de “Hiroshima”, era impossível fazer cinema como antes. (Existe uma versão completa na Internet, com tradução em espanhol. Abaixo, o trailer do filme).


Mrs. Enola Gay Tibbets
Enola Gay era mãe do piloto Cel. Paul Tibbets, que aprovou a “superfortaleza voadora” na fábrica da Boeing, e, com o nome materno, batizou o B-29. Tibbets sabia que a ordem de despejar se referia a alguma bomba especial, mas ao ver os primeiros efeitos, descobriu seu potencial. Para quem viu, como eu, o Enola em exposição, pode ter vivido a mesma sensação de quando subi, em 2006, ao segundo andar do prédio vizinho às Torres Gêmeas de NY, único lugar então permitido para observar a “terra arrasada”: silêncio e medo absurdos, um vazio dilacerador no coração.
A "Superfortaleza Voadora"

Cel. Tibbets, pronto para a missão sobre Hiroshima
A aeronave era um monstro quadrimotor de 30m de comprimento e 44m de wingspan (amplitude das asas, de uma ponta à outra). Foi essa máquina enorme e lerda (alcançava meros 355 Km/h), que transportou a Little Boy – “Garotinho”, nome eufemístico para a mais poderosa arma de destruição em massa jamais feita pelo homem. (Abaixo, uma impressionante reconstituição cinematográfica do lançamento da bomba).


Einstein e Oppenheimer
O Manhattan Project (no início, o QG da intelligentsia ficava na ilha novaiorquina, na Broadway St), foi um plano norte-americano apoiado pelo Reino Unido e Canadá. Einstein foi grande entusiasta dos experimentos com a reação nuclear em cadeia, e enviou uma carta que chegou às mãos do presidente americano Roosevelt mostrando o potencial de letalidade do urânio 235 em armas nucleares. Depois, declarou: “Eu sempre condenei o uso da bomba contra o Japão” (EINSTEIN, Albert. “Einstein on Peace”. NY: Nathan & Norden ed., 1960). Depoimento cuja veracidade é muito questionada, aliás.


Gladys Owens (à direita), operadora do Calutron
O secretíssimo trabalho diuturno de cientistas comandados pelo físico J. R. Oppenheimer chegou a empregar 130 mil pessoas, todas sem a menor noção de onde a pesquisa deveria chegar. (Na imagem acima, à direita, Gladys Owens, operadora do Calutron, passou mal ao descobrir sua foto em exposição sobre a bomba, 50 anos após o ataque! Não tinha ideia do objetivo daquele projeto, só sabia de suas atribuições como funcionária) 

"Little Boy" aguardando carregamento
A Little Boy parecia uma bomba comum: 4,4 T e apenas três metros de comprimento. A explosão emitiu raios-x pelo contato com o ar aquecido a até 6.000o C (temperatura comparável à da superfície do sol), em velocidade maior do que a do som, uma “bola de fogo”, cuja luz poderia cegar (essa temperatura de 6.000º C referia-se à superfície, pois no centro estima-se ter chegado a 1 milhão de graus Celsius). Vinte minutos depois, a tempestade incandescente. No total, podem ter sido 166 mil as vítimas do ataque, incluindo as seis mil que haviam escapado, mas morreram depois por graves sequelas. Em 7 de maio, os nazistas já haviam se rendido aos aliados; no dia 9 de agosto, Nagasaki foi bombardeada por outro artefato nuclear; dia 15, pouco após os massacres de Hiroshima e Nagasaki, e ante a declaração de guerra pela União Soviética, o Japão, acossado, se entrega. Essa rápida sequência encerrou a II Guerra, o maior conflito mundial da história. A bomba foi necessária? Do Eixo, contra os aliados, só havia sobrado o Japão! (Alguém duvida que as pesquisas com outros tipos de artefatos mais poderosos - a bomba de nêutrons é apenas um deles - ainda continuam?)

Vinicius de Moraes, que conseguia extrair beleza até do sofrimento e da infelicidade, nos deixou uma pérola de poema, “Rosa de Hiroshima”: “Pensem nas crianças / mudas telepáticas / pensem nas meninas / cegas inexatas / pensem nas mulheres / rotas alteradas / pensem nas feridas/ como rosas cálidas / mas, oh, não se esqueçam / da rosa da rosa / da rosa de Hiroshima / a rosa hereditária / a rosa radioativa / estúpida e inválida / a rosa com cirrose / a anti-rosa atômica / sem cor sem perfume / sem rosa, sem nada”. Essa Rosa é uma nefasta senhora que acaba de completar 70 anos, e se dói lembra-la, nunca se poderá esquecê-la. É uma tatuagem invisível e indelével que todos, homens e mulheres, carregamos e nossos filhos e netos carregarão, alarme para que um dia a humanidade não termine, ela mesma, por abrir as portas do Juízo Final.


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